Kyle Butt, M.A.
A
maioria das crianças e adultos facilmente reconhece o nome de Jesus Cristo.
Muitos até podem contar a história da Sua vida. Também facilmente reconhecíveis
são os nomes de Peter Pan e Rumpelstiltskin. E a maioria das pessoas pode
relatar os “fatos” destes contos de fada também. Jesus de Nazaré é um
personagem fictício que merece ser incluído em uma lista contendo mágicos
mistificadores, ousados matadores de dragões, e heróicos meninos voadores? O médico
mundialmente famoso e durante toda a vida crítico do Cristianismo, Albert
Schweitzer, respondeu com um sonoro “sim” quando escreveu:
O Jesus de Nazaré que se apresentou publicamente como o
Messias, que pregou a ética do Reino de Deus, que fundou o Reino do Céu na
terra, e morreu para dar à Sua obra sua consagração final, nunca teve qualquer
existência. Ele é uma figura projetada pelo racionalismo, dotado de vida pelo
liberalismo, e vestido pela teologia moderna com uma roupagem histórica (1964,
p. 398).
Em
tempos mais recentes, o ex-pregador que se voltou para o ateísmo, Dan Barker,
sugeriu que “o Jesus do Novo Testamento é um mito” (1992, p. 378). Estariam
essas visões baseadas em evidência histórica e seriam, portanto, dignas de
séria consideração? Ou será que representam meramente um pensamento ilusório
por parte daqueles que preferem crer – por qualquer razão que seja – que Cristo
nunca existiu? Foi Jesus Cristo um homem cujos pés ficaram sujos e cujo corpo
ficou cansado assim como o do resto da humanidade? Felizmente, tais questões
podem ser respondidas por um apelo honesto à evidência histórica disponível.
O que é
uma pessoa “histórica”? Martin Kahler sugere: “Não é a pessoa que origina e
lega uma influência permanente? É um daqueles indivíduos dinâmicos que intervêm
no curso dos acontecimentos” (1896, p. 63). Existe algum registro que documente
a afirmação de que Jesus Cristo “interveio no curso dos acontecimentos?”
Existem, sim.
Testemunho Hostil
É
interessante que o primeiro tipo de registro vem do que são normalmente
conhecidas como fontes “hostis” – escritores que mencionaram Jesus sob uma
ótica negativa ou de uma forma depreciadora. Tais autores certamente não
estavam predispostos a promover a causa de Cristo ou, de outro modo, dar mais
crédito à Sua existência. Na verdade, foi o exato oposto. Eles rejeitavam Seus
ensinos e muitas vezes O insultavam também. Assim, pode-se apelar para eles sem
a acusação viés pré-concebido.
Em seu
livro, The Historical Figure of Jesus, E.P.
Sanders declara: “A maior parte da literatura do primeiro século que ainda
sobrevive foi escrita por membros da elite muito pequena do Império Romano.
Para eles, Jesus (se de algum modo ouviram falar dele) era meramente um mágico
e agitador incômodo de uma parte pequena e atrasada do mundo” (1993, p. 49,
comentário entre parênteses no original). É agora a essa “pequena elite do
Império Romano” que voltamos a nossa atenção em busca de documentação a
respeito da existência de Cristo.
Tácito
(c. 56-117 a.D.) deveria estar entre os primeiros das várias testemunhas hostis
a serem chamadas à tribuna. Ele era membro da classe alta provincial romana com
uma educação formal que manteve várias posições elevadas sob diferentes
imperadores, tais como Nerva e Trajano (vede Tacitus, 1952, p. 7). Sua famosa obra,
Anais, era uma história de Roma
escrita aproximadamente em 115 a.D. Nos Anais,
ele conta a respeito do grande incêndio de Roma, que ocorreu em 64 a.D. Muitos
suspeitavam que Nero, o imperador romano da época, havia ordenado que a cidade
fosse incendiada. Tácito escreve:
Nero fabricou bodes expiatórios – e castigou com todos os
requintes os notoriamente depravados cristãos (como eram popularmente
chamados). Seu originador, Cristo, havia sido executado no reinado de Tibério
pelo governador da Judéia, Pôncio Pilatos. Mas, apesar deste recuo temporário,
a superstição mortal havia irrompido novamente, não apenas na Judéia (onde o
engano havia começado), mas até em Roma (1952, 15.44, comentários entre
parênteses no original).
Tácito
detestava tanto os cristãos como o seu homônimo, Cristo. Por isso ele não tinha
nada de positivo a dizer a respeito do que se referia como uma “superstição
mortal”. Contudo, tinha algo a dizer
sobre isto. Seu testemunho estabelece sem nenhuma dúvida razoável que a
religião cristã não apenas era historicamente relevante, mas que Cristo, como
seu originador, era uma figura histórica verificável de tal proeminência que Ele
atraía até a atenção do próprio imperador romano!
Testemunho
hostil adicional originou-se de Suetônio, que escreveu por volta de 120 a.D.
Robert Graves, como tradutor da obra de Suetônio, Os Doze Césares, declara:
Suetônio foi feliz em ter pronto acesso aos arquivos
imperiais e senatoriais e a um grande corpo de memórias contemporâneas e
documentos públicos, e em ter ele mesmo vivido quase trinta anos sob os
Césares. Grande parte da sua informação sobre Tibério, Calígula, Cláudio e Nero
vem de testemunhas oculares dos eventos descritos (Suetonius, 1957, p. 7).
O
testemunho de Suetônio é uma evidência histórica confiável. Duas vezes na sua
história, Suetônio menciona especificamente Cristo ou Seus seguidores. Ele
escreve, por exemplo: “Porque os judeus em Roma causavam constante tumulto por
instigação de Cresto, ele [Cláudio – nota do autor] os expulsou da cidade” (Claudius, 25:4; note que em Atos 18:2
Lucas menciona esta expulsão feita por Cláudio). Sander observou que Cresto é uma pronúncia incorreta de Cristo, “a palavra grega para o hebraico
‘Messias’” (1993, pp. 49-50). Suetônio comenta ainda: “Também foram infligidos
castigos nos cristãos, uma seita que professa uma nova e perniciosa crença
religiosa” (Nero, 16:2). Mais uma
vez, fica evidente que Suetônio e o governo romano nutriam sentimentos de ódio
por Cristo e Seu supostamente pernicioso bando de rebeldes. Fica do mesmo modo
evidente que Suetônio (e, na verdade, a maior parte de Roma) reconhecia que
Cristo era o notório fundador de uma nova religião historicamente
significativa.
Juntamente
com Tácito e Suetônio, deve-se conceder assento a Plínio, o Jovem, entre as
hostis testemunhas romanas. Em aproximadamente 110-111 a.D., Plínio foi enviado
pelo imperador romano para governar os negócios da região da Bitínia. Desta
região, Plínio correspondeu-se com o imperador a respeito de um problema que
ele considerava muito sério. Ele escreve: “Nunca estive presente em nenhum
julgamento de cristãos; por isso não conheço as penas ou investigações usuais,
e que limites são observados” (conforme citado em Wilken, 1990, p. 4). Então prossegue,
dizendo:
Este é o processo que tenho adotado no caso dos que são
trazidos diante de mim como cristãos. Eu lhes pergunto se são cristãos. Se
admitem, repito a pergunta uma segunda e terceira vez, ameaçando com a pena
capital; se persistem, eu os sentencio à morte (conforme citado em Wilken, p.
4).
Plínio
usou o termo “cristão” ou “cristãos” sete vezes em sua carta, corroborando-o
assim como um termo geralmente aceito que era reconhecido tanto pelo Império
Romano como pelo seu imperador. Plínio também usou o nome “Cristo” três vezes para
se referir ao originador da “seita”. É inegável o fato de que os cristãos, com
Cristo como seu fundador, haviam se multiplicado de tal modo que chamavam a
atenção do imperador e de seus magistrados pelo tempo da carta de Plínio a
Trajano. À luz desta evidência, é impossível negar o fato de que Jesus Cristo
existiu e era reconhecido pelos mais altos oficiais dentro do governo romano
como uma pessoa histórica, real.
Celso,
um filósofo pagão do segundo século, produziu um veemente ataque contra o
Cristianismo, com o título de O
Verdadeiro Discurso (c. 178 a.D.). Nesse vil documento, Celso argumenta que
Cristo devia sua existência ao resultado da fornicação entre Maria e um soldado
romano chamado Pantera. Quando cresceu, Jesus começou a chamar-se a si mesmo
Deus – um ato que, disse Celso, levou seus irmãos judeus a matá-lo. Contudo,
por mais denegridor que fosse o seu ataque, Celso nunca foi tão longe a ponto
de sugerir que Cristo não existira.
Alguns
têm procurado negar o testemunho dessas testemunhas romanas hostis à
historicidade de Cristo, sugerindo que as “fontes romanas que o mencionam são
todas dependentes de relatos cristãos” (Sanders, 1993, p. 49). Por exemplo, em
seu livro, The Earliest Records of Jesus,
Francis Beare lamenta:
Tudo o que foi registrado a respeito do Jesus da história
foi registrado para nós por homens para quem ele era Cristo, o Senhor; e não
podemos expurgar a fé deles dos registros sem tornar os próprios registros
virtualmente inúteis. Não existe nenhum Jesus conhecido para a história, exceto
aquele que é descrito pelos seus seguidores como o Cristo, o Filho de Deus, o
Salvador do Mundo (1962, p. 19).
Tal
sugestão é tão grotesca como ultrajante. Não apenas não há evidência em apoio a
tal afirmação, mas todas as evidências disponíveis militam contra ela. Ademais,
é uma posição insustentável sugerir que historiadores romanos de tão elevada
posição submeteriam à inclusão nos anais oficiais da história romana (para
serem preservados para a posteridade) fatos que lhes foram relatados por uma
notória tribo de desajustados “perniciosos”, “depravados” e “supersticiosos”.
Até
mesmo um leitor casual que olhe de relance para o testemunho das testemunhas
romanas hostis que testificaram a historicidade de Cristo ficará chocado pelo
fato de que esses homens antigos não descreveram Cristo nem como Filho de Deus,
nem como Salvador do mundo. Eles verbalmente O despojaram da Sua Filiação,
negaram a Sua glória, e depreciaram a Sua magnificência. Eles O descreveram aos
seus contemporâneos, e para a posteridade, como um mero homem. Contudo, ainda
que estivessem muito errados quanto à verdade de Quem Ele era, através das suas cáusticas diatribes eles
documentaram que Ele era. E por isso
ficamo-lhes obrigados.
Testemunho de Jesus entre os Judeus
Ainda
que grande parte do testemunho hostil a respeito da existência de Jesus se
originasse de testemunhas de dentro do Império Romano, tal testemunho não é o
único tipo de evidência histórica hostil disponível. Qualquer pessoa
familiarizada com a história judaica reconhecerá imediatamente a Mishná e o Talmude. A Mishná era um
livro de tradições legalistas judaicas codificado pelo rabino Judá por volta do
ano 200 a.D., e conhecido pelos judeus como “todo o código de jurisprudência
religiosa” (Bruce, 1953, p. 101). Os rabinos judeus estudavam a Mishná e até escreveram um corpo de
comentários baseados nela, conhecido como Gemará.
A Mishná e a Gemará são conhecidas coletivamente como Talmude (Bruce, 1953, p. 101). O Talmude completo veio a público por volta de 300 a.D. Se uma pessoa
tão influente como Jesus havia existido na terra da Palestina durante o
primeiro século, certamente os rabinos teriam algo a dizer sobre ele. Sem dúvida, um homem que supostamente
confrontou os líderes religiosos mais astutos de Seu tempo – e os venceu –
seria citado entre as opiniões daqueles que compartilhavam de Seu título
rabínico. Como declara Bruce:
De acordo com os rabinos mais antigos cujas opiniões estão
registradas nesses escritos, Jesus de Nazaré era um transgressor em Israel, que
praticava magia, desprezava as palavras dos sábios, desencaminhava o povo, e
dizia que não havia vindo para destruir a lei, mas para acrescentar a ela. Ele
fora pendurado na véspera da Páscoa por heresia e por enganar o povo. Seus
discípulos, dos quais cinco são citados, curavam os enfermos em seu nome (1953,
p. 102).
O
judaísmo do primeiro século em grande parte se recusou a aceitar Jesus Cristo
como o Filho de Deus. Contudo, não se recusou a aceitá-Lo como um homem
histórico de uma cidade literal conhecida como Nazaré, ou a registrar para a
posteridade fatos cruciais a respeito da Sua vida e morte.
Josefo é
outra testemunha judaica importante. Filho de Matatias, nasceu em uma família
judaica sacerdotal de classe alta em torno de 37 a.D. Sua educação na lei e história
bíblica estava entre as melhores do seu tempo (Sanders, 1993, p. 15). Aos
dezenove anos, tornou-se fariseu. Quando Jerusalém se revoltou contra as
autoridades romanas, foi-lhe dado o comando das forças judaicas na Galiléia.
Após perder a maioria dos seus homens, ele se rendeu aos romanos. Encontrou
favor no homem que comandava o exército romano, Vespasiano, predizendo que logo
Vespasiano seria elevado à posição de imperador. A predição de Josefo se
concretizou em 69 a.D. com a investidura de Vespasiano. Após a queda de
Jerusalém, Josefo assumiu o nome familiar do imperador (Flávio) e
estabeleceu-se, vivendo como pensionista do governo. Foi durante estes últimos
anos que ele escreveu Antiguidades
Judaicas, entre Setembro de 93 e Setembro de 94 (Bruce, 1953, pp. 103-104).
O próprio Josefo apresentou a data como sendo o décimo terceiro ano de
Domiciano (Rajak, 1984, p. 237). Seus contemporâneos consideravam sua carreira
indignadamente como de traiçoeira rebelião contra a nação judaica (Bruce, 1953,
p. 104).
Duas
vezes em Antiguidades, o nome de
Jesus brotou da pena de Josefo. Antiguidades
18:3:3 diz o seguinte:
E por esse tempo apareceu Jesus, um homem sábio, se é que deveríamos chamá-lo homem, pois
ele foi um operador de obras maravilhosas, um mestre dos homens que recebem a
verdade com prazer. Ele conduziu muitos judeus, e também gregos. Este homem era o Cristo. E quando
Pilatos o condenou à cruz com risco de seu impedimento pelos mais importantes
de entre nós, aqueles que o haviam amado a princípio não cessaram; pois ele lhes apareceu no terceiro dia vivo,
tendo os profetas divinos falado destas e de milhares de outras coisas
maravilhosas a respeito dele; e mesmo agora a tribo dos cristãos, assim
chamados à semelhança dele, ainda não desapareceu.
Alguns historiadores
consideram os segmentos em itálico da seção como “interpolação cristã”. Não
existe, porém, evidência alguma da crítica textual que justifique tal opinião
(Bruce, 1953, p. 110). Na verdade, todos os manuscritos gregos existentes
contêm as porções em disputa. A passagem também existe tanto nas versões
hebraica como árabe. E, embora a versão árabe seja ligeiramente diferente,
mesmo assim ela revela conhecimento das seções disputadas (vede Chapman, 1981,
p. 29; Habermas, 1996, pp. 193-196).
Existem
diversas razões geralmente oferecidas para rejeitar a passagem como genuína.
Primeiro, escritores cristãos antigos, como Justino Mártir, Tertuliano e
Orígenes não usaram a declaração de Josefo em sua defesa da divindade de
Cristo. Habermas observa que Orígenes, na verdade, documentou o fato de que
Josefo (embora fosse ele mesmo judeu) não cria que Cristo fosse o Messias
(1996, p. 192; cf. Contra Celso de
Orígenes, 1:47). Contudo, conforme Habermas também assinala, o escritor do
quarto século Eusébio, em sua História
Eclesiástica (1:11), citou a declaração de Josefo acerca de Cristo,
incluindo as palavras disputadas. E sem dúvida ele teve acesso a fontes bem
mais antigas do que aquelas agora disponíveis.
Ademais,
não deveria ser tão surpreendente que tais apologistas cristãos antigos não
apelassem para Josefo em seus escritos. Wayne Jackson sugere:
Os escritos de Josefo podem não ter estado em ampla
circulação naquele tempo. Suas Antiguidades
só foram completadas por volta de 93 a.D. Igualmente, em vista do fato de
que Josefo não era respeitado pelos judeus, suas obras podem não ter sido
valorizadas como uma ferramenta apologética (1991, 11:29).
Tal
sugestão tem o seu mérito. O professor Bruce Metzger comenta: “Porque Josefo
era considerado um renegado para o Judaísmo, os escribas judeus não estavam
interessados em preservar seus escritos para a posteridade” (1965, p. 75). Thomas
H. Horne, em sua Critical Introduction to
the Study and Knowledge of the Holy Scriptures, refere-se ao fato de que a
fonte principal de evidências frequentemente usada pelos assim chamados “pais
da igreja” era mais um apelo ao Antigo Testamento do que a fontes humanas
(1841, 1:463-464). A evidência substancia a conclusão de Horne. Por exemplo, um
exame do índice dos oito volumes da coleção Os
Pais Ante-Nicenos revela apenas onze referências a Josefo em toda a
coleção.
A
segunda razão às vezes oferecida quanto a por que a passagem disputada nas Antiguidades de Josefo poderiam ser
devidas a “interpolação cristã” é o fato de que parece improvável que um
escritor não-cristão incluísse declarações como “este homem era o Cristo” ou
“se de fato deveríamos chamá-lo homem”. Mas embora isto possa ser improvável,
certamente não está fora dos domínios da possibilidade. Muitas razões poderiam
explicar por que Josefo escreveria o que escreveu. Por exemplo, Bruce admite a
possibilidade de que Josefo poderia estar falando sarcasticamente (1953, p.
110). Howard Key sugere:
Se assumirmos que, ao fazer declarações explícitas a
respeito de Jesus como Messias e acerca da ressurreição, Josefo está meramente
transmitindo o que os seguidores de Jesus reivindicavam em seu favor, então não
haveria razão para negar que ele as escreveu [ou seja, as frases supostamente
interpoladas – nota do autor] (1970, p. 33).
Deve-se
também observar que Josefo não se qualifica como o único autor de declarações
como estas a respeito de Cristo feitas por aqueles que rejeitavam a Sua
divindade. Ernest Renan, por exemplo, foi um historiador francês do século
dezenove cujo livro, A Vida de Jesus, foi
um ataque frontal contra a divindade de Cristo, e que recebeu grande atenção
por toda a Europa (vede Thompson, 1994, 14:5). Contudo, nesse mesmo volume,
Renan escreveu: “É admissível chamar de Divina esta sublime pessoa que, a cada
dia, ainda preside sobre os destinos do mundo” (conforme citado em Schaff e
Roussel, 1868, pp. 116-117).
Ou então
considere H.G. Wells que, em 1931, escreveu The
Outline of History. Na página 270 desta famosa obra, Wells se refere a
Jesus como “um profeta de poder sem precedentes”. Nenhuma pessoa que conhecesse
Wells (um homem que certamente não cria na divindade de Cristo) jamais acusaria
seu relato de ter sido inutilizado por “interpolação cristã”. O famoso
humanista Will Durant era um confesso ateísta, e contudo escreveu: “A maior
questão do nosso tempo não é comunismo vs. individualismo, nem Europa vs.
América, nem mesmo Oriente vs. Ocidente; é se os homens podem suportar viver
sem Deus” (1932, p. 23). Comentários como os de Renan, Wells e Durant
documentam o fato de que, de vez em quando, até incrédulos têm escrito de
maneira convincente a respeito de Deus e de Cristo.
Ademais,
ainda que o material contendo a suposta interpolação cristã seja removido, o
vocabulário e a gramática da seção “combinam bem com o estilo e linguagem de
Josefo” (Meier, 1990, p. 90). De fato, praticamente cada palavra (omitindo de
momento as supostas interpolações) se encontra em outras passagens de Josefo
(Meier, p. 90). Se o material disputado fosse expurgado, o testemunho de Josefo
ainda confirmaria o fato de que Jesus Cristo realmente existiu. Habermas,
portanto, conclui:
Há boas indicações de que a maior parte do texto é
genuína. Não há evidência textual contra ele, e, pelo contrário, há muito boa
evidência manuscrita em favor desta declaração a respeito de Jesus, assim
tornando-a difícil de ser ignorada. Além disso, destacados eruditos nas obras
de Josefo [Daniel-Rops, 1962, p. 21; Bruce, 1967, p. 108; Anderson, 1969, p.
20] têm testificado que esta porção está escrita no estilo deste historiador
judeu (1996, p. 193).
Além do
que Josefo não ficou mudo a respeito de Cristo em suas seções posteriores. Antiguidades 20:9:1 relata que Anano
trouxe diante do Sinédrio “um homem chamado Tiago, irmão de Jesus que era
chamado o Cristo, e alguns outros. Ele os acusou de terem transgredido a lei, e
condenou-os a serem apedrejados até a morte”. Bruce observa que esta citação de
Josefo “é especialmente importante porque ele chama Tiago de ‘irmão de Jesus, o
assim chamado Cristo’, de tal modo a sugerir que ele já havia feito referência
a Jesus. E de fato encontramos referência a ele em todas as cópias existentes
de Josefo” (Bruce, 1953, p. 109). Meier, em um artigo intitulado “Jesus em
Josefo”, deixa claro que rejeitar esta passagem como tendo sido realmente
escrita por Josefo desafia a avaliação exata do texto (1990, pp. 79-81). Meier
também acrescentou outra defesa enfática da confiabilidade histórica do texto de
Antiguidades a respeito de Cristo.
Praticamente ninguém fica surpreendido ou se recusa a crer
que, no mesmo livro 18 de Antiguidades
Judaicas, Josefo também quis escrever um esboço maior de outro judeu
marginal, outro líder religioso peculiar na Palestina, “João, apelidado o
Batista” (Ant. 18:5:2). Felizmente
para nós, Josefo tinha mais do que um interesse passageiro em judeus marginais
(p. 99).
Não
obstante o que alguém acredite a respeito dos escritos de Josefo, o simples
fato é que este muito erudito historiador judeu escreveu a respeito de um homem
chamado Jesus, o Qual realmente existiu no primeiro século. Yamauchi resume
muito bem as descobertas das fontes seculares concernentes a Cristo:
Ainda que não tivéssemos o Novo Testamento ou escritos
cristãos, poderíamos concluir a partir de escritos não-cristãos tais como
Josefo, o Talmude, Tácito e Plínio, o
Jovem, que: (1) Jesus foi um mestre judeu; (2) muitas pessoas criam que ele
realizava curas e exorcismos; (3) foi rejeitado pelos líderes judaicos; (4) foi
crucificado sob Pôncio Pilatos no reinado de Tibério; (5) apesar desta morte
vergonhosa, seus seguidores, que acreditavam que ele ainda estava vivo, se
espalharam para além da Palestina, de modo que havia multidões deles em Roma
por volta de 64 a.D.; (6) todos os tipos de pessoas das cidades e do campo –
homens e mulheres, escravos e livres – adoravam-no como Deus por volta do
começo do segundo século (1995, p. 222).
A Confiabilidade dos Registros do Novo Testamento
Embora a
lista acima de testemunhas judaicas e hostis prove sem sombra de dúvida que
Jesus realmente existiu, de modo algum é a única evidência histórica disponível
àqueles interessados neste assunto. Os evangelhos (Mateus, Marcos, Lucas e
João), e os outros 23 livros que formam o Novo Testamento, fornecem mais
informação a respeito de Jesus do que qualquer outra fonte disponível. Mas será
que estes registros podem ser considerados como evidência histórica, ou são
antes escritos cuja confiabilidade empalidece em comparação com outros tipos de
documentação histórica? Blomberg explica por que a questão histórica dos
Evangelhos, por exemplo, deve ser considerada.
Muitos que nunca estudaram os evangelhos em um contexto
acadêmico acreditam que a crítica bíblica virtualmente refutou a existência [de
Cristo – nota do autor]. Um exame da confiabilidade histórica do evangelho deve,
portanto, preceder uma avaliação confiável acerca de quem era Jesus (1987, p.
xx).
Mas o quanto
os documentos do Novo Testamento se comparam aos documentos históricos antigos
adicionais? F. F. Bruce examinou grande parte da evidência em torno desta
questão em seu livro, The New Testament
Documents – Are They Reliable? Conforme ele e outros escritores (e.g.
Metzger, 1968, p. 36; Geisler e Brooks, 1990, p. 159) observaram, existem hoje
5.366 manuscritos do Novo Testamento grego, no todo ou em parte, que servem
para corroborar a exatidão do Novo Testamento. Os melhores manuscritos do Novo
Testamento são datados de aproximadamente 350 a.D., talvez um dos mais
importantes destes sendo o Códice Vaticano, “o maior tesouro da Biblioteca
Vaticana em Roma”, e o Códice Sinaítico, que foi adquirido pelos ingleses do
governo soviético em 1933 (Bruce, 1953, p. 20). Além disso, os papiros Chester
Beatty, trazidos a público em 1931, contêm onze códices, dos quais três contêm
a maior parte do Novo Testamento (inclusive os Evangelhos). Dois destes códices
ostentam como data a primeira parte do terceiro século, enquanto o terceiro é
um pouco mais recente, datando da última metade do mesmo século (Bruce, 1953,
p. 21). A Biblioteca John Rylands se orgulha de evidências ainda mais antigas.
Um códice de papiro contendo partes de João 18 data do tempo de Adriano, que
reinou de 117 a 138 a.D. (Bruce, 1953, p. 21).
Outro
testemunho da exatidão dos documentos do Novo Testamento pode ser encontrado
nos escritos dos assim chamados “pais apostólicos” – homens que escreveram
principalmente de 90 a 160 a.D. (Bruce, 1953, p. 22). Ireneu, Clemente de
Alexandria, Tertuliano, Clemente de Roma e Inácio (que escreveram antes do
final do segundo século), todos fizeram citações de um ou mais Evangelhos
(Guthrie, 1990, p. 24). Outras testemunhas da exatidão original do Novo
Testamento são as Versões Antigas, que consistem do texto do Novo Testamento
traduzido para diferentes línguas. A Velha Latina e a Velha Siríaca são as mais
antigas, sendo datadas da metade do segundo século (Bruce, 1953, p. 23).
A
evidência disponível deixa claro que os Evangelhos foram aceitos como
autênticos por volta do final do segundo século (Guthrie, p. 24). Eles estavam
completos (ou essencialmente completos) antes de 100 a.D., com muitos dos
escritos circulando de 20 a 40 anos antes do final do primeiro século (Bruce,
1953, p. 16). Linton observa com respeito aos Evangelhos:
Um fato conhecido de todos os que têm feito algum estudo
sobre este assunto é que esses livros foram citados, listados, catalogados,
harmonizados, citados como autoridade por diferentes escritores, cristãos e
pagãos, desde o tempo dos apóstolos (1943, p. 39).
Tal
avaliação está absolutamente correta. De fato, o Novo Testamento desfruta de
documentação histórica muito maior do que qualquer outro volume jamais
conhecido. Existem apenas 643 cópias da Ilíada
de Homero, que inegavelmente é o livro mais famoso da Grécia antiga.
Ninguém duvida do texto das Guerras
Gálicas de Júlio César, mas temos apenas 10 cópias dele, das quais a mais
antiga foi feita 1.000 anos depois que foi escrito. Ter tamanha abundância de
cópias para o Novo Testamento dentro de 70 anos após a sua escrita não é nada
menos do que espantoso (Geisler e Brooks, 1990, pp. 159-160).
Alguém
poderia alegar que os documentos do Novo Testamento não podem ser confiados
porque os escritores tinham uma agenda. Mas em si isto não torna o que eles
disseram falso, especialmente à luz da evidência corroborante das testemunhas
hostis. Existem outras histórias que são aceitas a despeito das agendas de seus
autores. Uma “agenda” não anula a possibilidade do conhecimento histórico
exato.
Em sua
obra The New Testament Documents – Are
They Reliable?, Bruce apresentou mais comparações surpreendentes. Lívio
escreveu 142 livros da história romana, dos quais apenas 35 sobreviveram. Os 35
livros conhecidos ficaram conhecidos devido a uns 20 manuscritos, dos quais
apenas um é do quarto século. Temos apenas dois manuscritos das Histórias e dos Anais de Tácito, um do nono século e outro do século onze. A História de Tucídides, outra obra antiga
famosa, depende apenas de oito manuscritos, dos quais o mais velho é datado de
aproximadamente 900 a.D. (juntamente com alguns fragmentos de papiro datados do
começo da era cristã). A História de
Heródoto encontra-se em situação semelhante. “Contudo nenhum estudioso clássico
daria ouvidos ao argumento de que a autenticidade de Heródoto ou Tucídides está
em dúvida porque os manuscritos mais antigos das suas obras que têm alguma
utilidade para nós são mais de 1.300 anos mais recentes do que os originais”
(Bruce, 1953, pp. 20-21). Bruce assim declara: “É um fato curioso que
historiadores frequentemente estejam muito mais prontos a confiar nos registros
do Novo Testamento do que muitos teólogos” (1953, p. 19). Nas palavras de
Linton:
Não há espaço para questionar se os registros das palavras
e atos de Jesus da Galiléia vieram das penas dos homens que, com João,
escreveram o que haviam “ouvido” e “visto”, e suas mãos haviam “tocado da
Palavra da vida” (1943, pp. 39-40).
Conclusão
Quando
alguém faz a pergunta: “A vida de Jesus Cristo é um evento histórico?”, ele
deve se lembrar de que “se afirmarmos que a vida de nosso Senhor não é um
evento histórico, acabaremos em dificuldades desesperadoras; em consonância com
isto, teremos de desistir de toda a história antiga, e negar que jamais houve
um evento tal como o assassinato de Júlio César” (Monser, 1961, p. 377).
Confrontados
com evidência tão esmagadora, é insensato rejeitar a posição de que Jesus
Cristo realmente andou nas ruas de Jerusalém no primeiro século. Como Harvey
observou, existem certos fatos a respeito de Jesus que “são atestados ao menos
por tanta evidência confiável quanto o são incontáveis outros considerados como
fatos históricos conhecidos por nós acerca do mundo antigo”. Mas para que eu
não seja acusado de citá-lo erroneamente, permita-me assinalar que Harvey
continuou dizendo: “Mesmo assim pode-se argumentar que não podemos ter
conhecimento histórico confiável a respeito de Jesus com respeito a qualquer
coisa que realmente seja importante” (1982, p. 6).
Harvey
não podia negar o fato de que Jesus viveu nesta Terra. Os críticos não gostam
de ter de admitir isto, mas não podem negar com êxito o fato de que Jesus
causou no mundo um impacto maior do que qualquer vida individual antes ou
depois. Nem podem negar o fato de que Jesus morreu sob Pôncio Pilatos. Harvey e
outros podem apenas dizer que tais fatos “realmente não importam”. Eu afirmo
que os fatos que estabelecem a existência de Jesus Cristo de Nazaré realmente importam. Como Bruce declara: “Os
propagadores mais antigos do Cristianismo deram boas vindas ao mais pleno exame
das credenciais da sua mensagem” (1953, p. 122). Enquanto Paulo estava sendo
julgado diante do rei Agripa, ele disse a Festo: “Porque o rei, diante de quem
falo com ousadia, sabe estas coisas, pois não creio que nada disto lhe é
oculto; porque isto não se fez em
qualquer canto” (Atos 26.26).
Assim como
os antigos apologistas do Cristianismo deram boas vindas a um pleno exame das
credenciais da mensagem que pregavam, assim também fazemos hoje. Essas
credenciais têm sido pesadas na balança e não
foram achadas em falta. O simples fato é que Jesus Cristo existiu e viveu
entre os homens.
É impossível dizer que ninguém tem o direito de ser
agnóstico. Mas ninguém tem o direito de ser agnóstico enquanto não tiver lidado
assim com a questão, e confrontado este fato com uma mente aberta. Depois
disso, ele pode ser um agnóstico – se puder (Anderson, 1985, p. 12).
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Fonte: Apologetics Press (www.apologeticspress.org)
Tradução:
Rodrigo Reis de Faria
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