segunda-feira, 16 de julho de 2012

Mitologia Pagã e a Bíblia


Garry K. Brantley, M.A., M.Div.




“Toda a escritura é dada por inspiração de Deus...” (2 Timóteo 3:16). Que afirmação! Este verso reivindica que a Bíblia é o único produto literário de origem divina, não o resultado de mero talento humano. Como tal, ela serviria justamente como o padrão último de autoridade moral e religiosa da humanidade. Mas, será verdadeira esta reivindicação? Através dos anos, estudiosos conservadores têm ordenado evidências em apoio à reivindicação da Bíblia à inspiração, enquanto teólogos liberais têm procurado desacreditar sua autoridade divina declarada. O debate continua.

Descobertas arqueológicas têm representado um papel importante nesta controvérsia contínua. Alguns estudiosos sentem que as descobertas de antigos textos literários pagãos fornecem munição efetiva para com ela atacar a reivindicação bíblica à inspiração. Por quê? Os filólogos têm identificado formas lingüísticas e literárias comuns a textos bíblicos e extra-bíblicos, o que sugere para alguns que a religião israelita – ao invés de ser produto de orientação divina – foi adaptada a partir das religiões pagãs vizinhas. Em particular, os textos escavados em Ras Shamra, que datam do século quinze a.C., estão no coração desta contenda.

As Tabuinhas de Ras Shamra

Ras Shamra é o nome moderno da antiga cidade de Ugarit. Antes de 1928, os arqueólogos não sabiam a localização exata desta cidade. Na primavera daquele ano, um camponês sírio estava arando um campo exatamente ao oriente de Ras Shamra. Seu arado acidentalmente colidiu com uma rocha, que revelou ser uma pedra tumular. A presença deste cemitério antigo sugeriu aos arqueólogos que havia uma cidade nas proximidades, provavelmente oculta no tell (morro). Investigações adicionais revelaram que esta suposição era verdadeira.

Claude F. A. Schaeffer do Museu de Estrasburgo, e seu sócio George Chenet, começaram a escavação sistemática de Ras Shamra, sob os auspícios do governo francês. Em maio de 1929, sua equipe escavou as primeiras tabuinhas de barro contendo escrita cuneiforme (em formato de cunha) desconhecida. Schaeffer, que não era um lingüista, confiou os textos a Charles Virolleaud, um especialista nas línguas antigas daquela região. Virolleaud imediatamente reconheceu a importância desses textos. O cuneiforme destas tabuinhas recém-descobertas era diferente de qualquer um que ele havia visto antes. Textos cuneiformes existentes antes desta descoberta continham várias centenas de símbolos diferentes. As tabuinhas de Ugarit, porém, continham menos de 30 caracteres distintos, o que sugeriu a Virolleaud que as tabuinhas exibiam uma espécie de alfabeto cuneiforme.

Virolleaud fez pouco progresso na decifração do texto nas primeiras semanas. Contudo, como um préstimo aos estudiosos, ele publicou os textos, fornecendo tanto fotografias como cópias das inscrições que seus colegas examinaram. Hans Bauer, professor de línguas orientais na universidade alemã de Halle e especialista na área de criptoanálise (decifração de códigos), conseguiu atribuir valores fonéticos a aproximadamente oitenta por cento dos sinais apenas em cinco dias. Outros estudiosos refinaram sua obra, e, a partir do verão de 1930, as tabuinhas de Ras Shamra recuperadas pela equipe de Shaeffer puderam ser traduzidas e lidas (para uma discussão acerca dos achados arqueológicos encontrados em Ras Shamra, vede Craigie, 1983; Jackson, n.d.; Kapelrud, 1962; Pfeiffer, 1975).

Estudos Hebraico-Ugaríticos

Os arquivos de Ugarit revelaram literalmente milhares de tabuinhas contendo várias línguas e tipos diferentes de literatura. Os textos que prenderam a atenção dos estudiosos, porém, foram aqueles que continham o cuneiforme alfabético. Os lingüistas chamam a língua desta escrita de ugarítico, de acordo com a cidade antiga em que era usada. O ugarítico é uma língua semítica do noroeste, linguisticamente bastante próxima do hebraico bíblico. Esses textos ugaríticos têm causado uma influência profunda nos estudos religiosos. Sua importância surge, não apenas pelas relações lingüísticas, mas também pelas formas literárias comuns tanto ao ugarítico como ao hebraico bíblico.

Os estudiosos quase que imediatamente começaram a enfatizar essas semelhanças. Em 1934, apenas quatro anos depois que Virolleaud publicou os textos, J. W. Jack cautelosamente realçou os paralelos entre os textos ugaríticos e a Bíblia hebraica. Outros estudiosos seguiram o exemplo. Tal análise literária comparativa eventualmente deu origem a uma nova disciplina: estudos hebraico-ugaríticos. Esta disciplina tem causado tanto efeitos positivos como negativos nos estudos bíblicos.

Efeitos Positivos

Do lado positivo, os textos ugaríticos têm iluminado nosso entendimento acerca de palavras obscuras, e de práticas religiosas pagãs que aparecem na Bíblia hebraica. Por exemplo, esses textos têm auxiliado nosso entendimento acerca do termo “pastor” aplicado a Amós (Amós 1:1). A palavra hebraica comum para pastor é ro’eh. Contudo, a palavra que descreve a ocupação de Amós é noqed, que aparece apenas em outra passagem da Bíblia hebraica (2 Reis 3:4; vede Harris, 1980, 1:1410). Nos textos ugaríticos, a palavra cognata nqd aparece aproximadamente dez vezes, e designa um vendedor de ovelhas, ao invés de um simples pastor. Portanto, pode ser que a ocupação de Amós o levasse aos mercados do norte de Israel (para vender lã e carne de carneiro), onde se envolveu no seu ministério profético (Craigie, 1983, 9[5]:73). Tais critérios lingüísticos ajudam a responder à questão: por que Amós, do reino do sul de Judá, estava particularmente familiarizado com as injustiças sociais de Israel (cf. Amós 2:7; 4:1; 8:5).

Além disso, as tabuinhas de Ras Shamra aumentaram o nosso conhecimento acerca do baalismo, frequentemente mencionado na Bíblia. Esses textos mitológicos associam Baal à chuva, tempestade e fertilidade, e proclamam-no como “[o deus] Haddu, senhor da nuvem tempestuosa” (Cross, 1973, p. 147; vede Kapelrud, 1962, 4:729; Pritchard, 1958, 1:92-118). Através da chuva, Baal supostamente fornecia solo fértil que produzia colheitas das quais tanto os homens como os animais dependiam. Assim, os adoradores de Baal procuravam manter sua supremacia para que suas colheitas que sustentavam a vida pudessem continuar. Tais critérios sobre o baalismo fornecidos por textos ugaríticos iluminam diversas narrativas bíblicas, particularmente o debate de Elias com os profetas de Baal no Monte Carmelo (1 Reis 18; vede Long, 1990). Ali, Yahweh (isto é, Jeová) – não Baal – provou ser o controlador da chuva e da tempestade (na forma do relâmpago que “caiu como fogo”). Esses critérios ugaríticos sobre o baalismo aumentam a nossa compreensão acerca daquele histórico debate.

Efeitos Negativos

Juntamente com essas valiosas contribuições ugaríticas aos estudos bíblicos, surgiram alguns resultados negativos. Particularmente, estudiosos liberais deram indevida importância às semelhanças lingüísticas e literárias entre os textos míticos ugaríticos e certas porções da Bíblia hebraica. Isto levou alguns estudiosos a objetarem que “... em estudos comparativos da mitologia ugarítica e da literatura veterotestamentária em geral, demasiada ênfase tem sido dada à semelhança ou ao ‘fato’ da similaridade na forma ...” (Tsumura, 1988, 40:27). Tal ênfase excessiva impeliu alguns estudiosos a concluírem que a religião israelita fosse uma mera “javeização” das religiões pagãs (ou seja, atribuindo a Jeová o que as religiões pagãs atribuíam aos seus deuses). Esses estudiosos argumentam que a prova dessa adaptação aparece na Bíblia hebraica, particularmente em certas seções poéticas (cf. Cross, 1973, 1992; Malamat, 1988).

Salmo 29, um exemplo clássico

Um texto bíblico particular – o salmo 29 – tem sido submetido a extensas análises comparativas hebraico-ugaríticas. Desde 1935, H. L. Ginsberg postulava um fundo cananita ou fenício para este salmo (Malamat, 1988, 100[sup]:156). O consenso acadêmico atual é de que o culto a Baal, tal como retratado nos textos ugaríticos, serviu como pano de fundo para o salmo 29 (Craigie, 1983, 9[5]:73). Por exemplo, o falecido Mitchell Dahood, que usou extensamente o ugarítico em seu comentário clássico de três volumes sobre os Salmos, argumentava que o “reconhecimento [de Ginsberg] de que este salmo é uma adaptação javista de um hino cananita mais antigo ao deus da tempestade Baal ...” foi “... corroborado pela subseqüente descoberta das tabuinhas em Ras Shamra e pelo progresso na interpretação destes textos” (1966, 1:175, ênfase acrescentada). Mais recentemente, A. Malamat, juntamente com a Universidade Hebraica de Jerusalém, concluiu que este salmo “... é derivado de tradições que se reportam até antes da Era do Bronze Tardia de Ugarit, a tempos da antiga Babilônia, ou mesmo dos amoritas ...” (1988, 100[sup]:160). Ademais, Frank Moore Cross sugeriu que o salmo 29 era um “hino a Baal ligeiramente revisado ...” e que é representante de textos bíblicos nos quais sobrevive “pura mitologia” (1992, 8[5]:19).

Semelhanças

Os estudiosos baseiam tais conclusões a respeito do pano de fundo do salmo 29 em semelhanças entre o mesmo e textos míticos ugaríticos (e outros). Os arqueólogos têm escavado vários fragmentos de tabuinhas contendo textos mitológicos poéticos nos quais Baal e Anate (a deusa da guerra) representam os papéis principais. Em determinada seção, o lirista pagão mencionava que o material para a construção do palácio de Baal vinha do “... Líbano e de suas árvores, De Sirion seus cedros preciosos” (Pritchard, 1958, 1:104). Em outra seção, Baal aparece como o deus-tempestade, mandando raios com trovões (isto é, “sua voz sagrada”) à Terra, que fazem seus “inimigos tremerem”. Este texto enfatiza o poder da voz de Baal, que “convulsiona a terra” e faz as “montanhas tremerem” (Pritchard, 1958, 1:106).

Linguagem semelhante aparece no salmo 29. Este salmo, assim como o hino a Baal, menciona os cedros do Líbano e Sirion (v. 6). Além disso, o salmista enfatizou a voz de Jeová, que causava um efeito semelhante na Terra ao que se atribuía a Baal (vv. 3-5, 7-9). O salmo 29 declara que a voz de Jeová “quebra os cedros” (v. 5), “faz tremer o deserto” (v. 8), e “desnuda as florestas” (v. 9).

Considerações Úteis

Obviamente, existem algumas semelhanças entre o salmo 29 e o hino a Baal. Mas, será que tais semelhanças implicam em dependência literária e religiosa de Israel sobre as religiões pagãs contemporâneas? As seguintes considerações poderiam ser úteis ao tratar desta questão. Elas sugerem princípios que também se aplicarão a outros textos bíblicos nos quais existem semelhanças com mitos pagãos.

Semelhança, não Dependência

Primeiro, o fato de que existam algumas semelhanças entre a Bíblia hebraica e alguns mitos pagãos não implica nem em dependência da primeira sobre os últimos, nem sentido sinônimo. John Wheeler observa corretamente:

O perigo básico ao comparar a Bíblia hebraica ... com textos religiosos de outras culturas está em que a Bíblia usa linguagem semelhante para descrever coisas diferentes. A Bíblia tem o direito de ser interpretada pelo seu próprio contexto, assim como qualquer outra obra literária ... Quando alguém examina o salmo 29 cuidadosamente, à luz do restante da Escritura, os erros sutis que surgem pelo uso de uma estrutura extra-bíblica para interpretar a Bíblia podem ser percebidos (1992, 5[1]:28, ênfase acrescentada).

É uma exegese imprópria forçar crenças pagãs para o texto bíblico simplesmente devido a semelhanças lingüísticas. Ademais, como Leupold precisamente conclui: “Ninguém precisa ficar alarmado com tais descobertas se tivermos em mente que dois tipos ligeiramente distintos de língua cananita (ou hebraica) estão envolvidos. A menor de todas é a dependência da produção hebraica em tal caso estabelecido” (1959, p. 17). A Bíblia tem o direito de definir suas próprias palavras e conceitos; mitos pagãos não são o fator determinante da interpretação bíblica.

Nem Um Só Paralelo

Segundo, os paralelos traçados entre textos bíblicos e ugaríticos abrangem uma ampla variedade de formas literárias. Nem um só texto ugarítico é totalmente paralelo ao salmo 29. Alguns estudiosos deixam a impressão de que um poema a Baal existente é exatamente paralelo ao salmo 29, com exceção de que os nomes de Baal e Jeová são trocados. Por exemplo, Theodor Gaster argumentou que este salmo era inicialmente cananita, mas o salmista o modificou substituindo o nome de Baal pelo nome pessoal do Deus de Israel (1946-1947, 37:55-65).

Contudo, o salmo 29 não pode ser localizado em nenhum texto ugarítico particular. Semelhanças de linguagem, vocabulário e formas literárias existem entre a literatura hebraica e ugarítica em geral. Mas, a idéia de que o salmo 29 é uma javeização de um hino a Baal surge de uma comparação de textos de culturas diferentes, cada qual com sua própria variação sobre o mesmo tema pagão (vede Wheeler, 1992, 5[1]:28). Com efeito, o falecido ugaritólogo P. C. Craigie observou que “... virtualmente todos os estudos comparativos hebraico-ugaríticos envolvem a comparação de diferentes formas literárias” (conforme citado em Tsumura, 1988, 40:25, ênfase no original). Assim, sugerir que o salmo 29 (ou qualquer outro texto bíblico) é uma adaptação de um mito pagão não possui nenhuma base evidencial.

Meio Cultural Comum

Terceiro, deveríamos contar com alguma semelhança de linguagem e estilo literário entre textos bíblicos e extra-bíblicos devido ao meio cultural comum (vede Redford, 1987, 13[3]:27). De fato, se a linguagem e o estilo bíblico fossem totalmente diferentes da literatura de seus contemporâneos seculares, a autenticidade da Bíblia seria suspeita. Ademais, figuras e estilo literário familiares facilitariam às nações gentias a compreensão da verdade. Em consonância com esta observação, Alexander Heidel argumentou que “uma vez que o Antigo Testamento também era planejado para o mundo gentio, é natural que os autores bíblicos se valessem de figuras de linguagem e imaginário com os quais os vizinhos de Israel também estivessem familiarizados, ou que fossem ao menos facilmente compreensíveis a eles” (1951, p. 138).

Além disso, a existência dessas semelhanças demonstra eloquentemente a integridade da Bíblia. Nesta linha de pensamento, John Wheeler observou que tais semelhanças “... fornecem uma das principais evidências de que a maior parte dos salmos não foram escritos após o exílio babilônico. Sua linguagem se encaixa com a que era usada pelos vizinhos de Israel no mesmo período de tempo em que a nossa Bíblia hebraica afirma que os salmos foram escritos” (1992, 5[1]:28, ênfase no original). Assim, ao invés de militar contra a credibilidade da Bíblia, essas semelhanças apóia a sua integridade.

Possibilidade Polêmica

Finalmente, podemos explicar algumas dessas semelhanças como polêmicas inspiradas contra as crenças pagãs. Em outras palavras, ao invés de adaptar mitos pagãos ao gosto do preconceito religioso de Israel, os escritores inspirados conscientemente rejeitaram as idéias pagãs, e defenderam a causa de Jeová (vede Frymer-Kensky, 1978, 4[4]:37). A evidência escriturística indica que os israelitas estavam familiarizados com as religiões pagãs. Por exemplo, o Pentateuco contém proibições de práticas idolátricas específicas como sacrifícios humanos (Deuteronômio 12:31), e cozinhar um filhote no leite de sua própria mãe (Êxodo 23:19; 34:26; Deuteronômio 14:21; vede Ackerman, 1993). De fato, textos ugaríticos mencionam que o rito de cozinhar um filhote no leite de sua própria mãe era um meio aceitável de se aproximar de um deus (Archer, 1974, p. 179). A menção de tais ritos religiosos específicos indica a familiaridade dos israelitas com as práticas pagãs, das quais deveriam se abster.

Contudo, quase que de imediato à ocupação de Canaã, os israelitas ficaram apaixonados por Baal, e o adoraram (vede Juízes 3:7). Tal apostasia ocorreu repetidamente na história de Israel. Amós, por exemplo, lembrou Israel de sua longa história de flertes com as divindades pagãs, o que os levou ao seu cativeiro estrangeiro (5:25-27). Com a perene propensão de Israel a abandonar Jeová, esperaríamos encontrar polêmicas contra essas falsas divindades na literatura religiosa de Israel. Uma dessas declarações polêmicas dirigidas contra os falsos deuses aparece no salmo 96:5, “Porque todos os deuses dos povos são ídolos (’elilim); mas Jeová fez os céus”. A palavra hebraica ’elilim (ídolos) descreve o que é inútil e deficiente – em contradição com o poder criativo de Jeová, o verdadeiro Deus (vede Harris, 1980, 1:95). Ademais, a supremacia de Jeová demonstrada sobre Baal no Monte Carmelo é um exemplo vívido de tal polêmica na literatura sagrada de Israel (1 Reis 17-18). Assim, o salmista inspirado pode ter moldado o salmo 29 como uma polêmica contra o baalismo. Isto, porém, não implica em que o salmista javeizou um hino de Baal. Ele simplesmente poderia estar reagindo a conceitos geralmente conhecidos associados a essa divindade pagã.

Conclusão

Não precisamos negar que existam algumas semelhanças entre a literatura hebraica e a pagã. Mas essas semelhanças não implicam que textos míticos pagãos influenciaram diretamente os escritos bíblicos. A qualidade literária da poesia pagã argumenta contra tal dependência. Para ilustrar, os estudiosos identificaram ao menos uma modificação pagã de um salmo hebraico (uma adaptação egípcia do salmo 20, datando de c. 125 a.C.), cuja qualidade literária era bem inferior ao original. Este documento egípcio (escrito em papiro) foi descoberto algum tempo antes da virada do século. Os filólogos egípcios logo identificaram a escrita como demótica – um tipo cursivo de escrita hieroglífica que esteve entrou em uso por volta de 650 a.C. Durante anos, porém, seu conteúdo permaneceu um enigma para os especialistas.

Progresso na decifração do texto aconteceu em 1940, quando o professor Raymond Bowman e o egiptólogo George R. Hughes descobriram que, embora o texto estivesse redigido em escrita demótica, a língua real era o aramaico. O documento egípcio contém palavras judaicas como YHWH (ou seja, Jeová) e ’adonay, mas também menciona um grupo de deuses pagãos (p.e., Horus, Sahar, Mar e Baal). Essas características, e sua familiaridade de língua e composição com o salmo 20, indicam que foi adaptado a partir do salmo hebraico. O texto, porém, está cheio de erros de tal natureza que indicam que o escriba não entendia o que transcreveu (vede Shanks, 1985). Tal não é a característica da poesia bíblica. Sua qualidade literária, de acordo com alguns estudiosos, é bem superior à de cepa pagã (vede Wheeler, 1992). Esta certamente seria uma indicação de sua originalidade.

Além disso, juntamente com a sua distinta qualidade literária, os conceitos espirituais e éticos da Bíblia não são igualados pela literatura sagrada pagã. Por exemplo, os deuses dos mitos pagãos são culpados de comportamento degenerado de todos os tipos; o verdadeiro Deus é infinito em pureza. Os praticantes das religiões pagãs constantemente trabalhavam para apaziguar seus deuses irados; os adoradores de Jeová, Que era pronto para perdoar, recebiam bênçãos imerecidas das Suas mãos graciosas (Salmo 32:1-5). Assim, as semelhanças entre a literatura bíblica e a pagã são eclipsadas pelas enormes diferenças. Na verdade, não há melhor indicação da inspiração da Bíblia do que colocá-la lado a lado com as suas contrapartes pagãs. Tais análises literárias comparativas animam a nossa convicção de que “toda a escritura é dada por inspiração de Deus...” (2 Timóteo 3:16).

Referências

Ackerman, Susan (1993), “Child Sacrifice: Returning God’s Gift,” Bible Review, 9[3]:20ff., June.
Archer, Gleason, Jr. (1974), A Survey of Old Testament Introduction (Chicago: Moody).
Craigie, Peter (1983), “The Tablets From Ugarit and Their Importance for Biblical Studies,”Biblical Archaeology Review, 9[5]:62-69, September/October.
Cross, Frank Moore (1973), Canaanite Myth and Hebrew Epic (Cambridge, MA: Harvard University Press).
Cross, Frank Moore (1992), “The Development of Israelite Religion,” Bible Review, 8[5]:18-29,50, October.
Dahood, Mitchell (1966), “Psalms,” The Anchor Bible (Garden City, NY: Doubleday).
Frymer-Kensky, Tikva (1978), “What Babylonian Flood Stories Can and Cannot Teach Us About the Genesis Flood,” Biblical Archaeology Review, 4[4]:32-41.
Gaster, Theodore (1946-1947), “Psalm 29,” Jewish Quarterly Review, 37:55-65.
Harris, R.L., G.L. Archer, and B.K. Waltke, eds. (1980), Theological Wordbook of the Old Testament (Chicago:Moody).
Heidel, Alexander (1951), The Babylonian Genesis (Chicago: University of Chicago Press).
Jackson, Wayne (n.d.), Archaeology: The Ras Shamra Discovery, Research Article Series (Montgomery, AL: Apologetics Press).
Kapelrud, A.S. (1962), “Ugarit,” Interpreter’s Dictionary of the Bible (Nashville, TN: Abingdon) 4:724-732.
Leupold, H.C. (1959), Exposition of the Psalms (Grand Rapids, MI: Baker).
Long, Jesse, Jr. (1990), “God Doesn’t Always Thunder,” Gospel Advocate, 132[12]:32, December.
Malamat, A. (1988), “The Amorite Background of Psalm 29,” Zeitschrift fur die Alttestamentliche Wissenschaft, 100[sup]:156-160.
Pfeiffer, C.F. (1975), “Ugarit,” The Zondervan Pictorial Encyclopedia of the Bible (Grand Rapids, MI: Zondervan), 5:837-842.
Pritchard, James B., ed. (1958), The Ancient Near East: An Anthology of Texts and Pictures(Princeton, NJ: Princeton University Press).
Redford, Donald (1987), “Similarity Between Egyptian and Biblical Texts—Indirect Influence?,”Biblical Archaeology Review, 13[3]:18-32, May/June.
Shanks, Hershel (1985), “Bible’s Psalm 20 Adapted for Pagan Use,” Biblical Archaeology Review, 11[1]:20-23.
Tsumura, David (1988), “Ugaritic Poetry and Habakkuk 3,” Tyndale Bulletin, 40:24-48.
Wheeler, John (1992), “Who Wrote Psalm 29: David or a Canaanite?,” Archaeology and Biblical Research, 5[1]:23-31, Winter.

Copyright © 1993, Apologetics Press, Inc.
Fonte: Apologetics Press (www.apologeticspress.org)
Tradução: Rodrigo Reis de Faria

Nenhum comentário:

Postar um comentário