terça-feira, 27 de novembro de 2012

Origem e História do Catolicismo (Parte II)


Moisés Pinedo

DESENVOLVIMENTO DO CATOLICISMO

Uma nova igreja havia nascido, uma igreja completamente diferente da igreja estabelecida por Cristo. Enquanto a igreja de Cristo havia nascido em Jerusalém (Atos 1:12; 2:1; etc.), esta igreja nascera em Roma. Enquanto a igreja de Cristo havia nascido com poder espiritual (Atos 2:2-4), esta igreja nascera com poder político e militar. Enquanto a igreja de Cristo havia nascido sob a autoridade de uma Cabeça divina (Colossenses 1:18), esta igreja nascera sob a autoridade de uma cabeça humana – o papa. Esta nova igreja logo invadiu a Terra com as suas doutrinas.

Contudo, uma ameaça inesperada para este tipo de Cristianismo estava rapidamente se aproximando desde o Oriente: o Islam. Com Muhammad como seu líder, a religião do Islam originou-se em 622 a.D. e espalhou-se agressivamente. Em menos de 25 anos desde o início da “Hégira” (i.e. a partida de Muhammad de Meca), os seguidores de Muhammad haviam tomado o controle do Egito, Palestina, Pérsia e Síria (Mattox, 1961, p. 173). Com a sua sede de conquista, esta religião ameaçava converter o mundo inteiro às suas crenças. Logo a ameaça para o Catolicismo tornou-se cada vez mais óbvia. Muitos católicos em nações conquistadas haviam se convertido ao Islam por medo; o avanço desta doutrina sobre a influência romana e sua religião oficial parecia inevitável. A religião romana, e a unidade da nação que dependia dela, logo entrariam em colapso se algo não fosse feito rapidamente. Assim os conflitos entre católicos e muçulmanos deram origem às infames Cruzadas.

As Cruzadas (de 1096 a 1270) foram expedições militares que se colocaram em marcha como um cumprimento a um “solene voto” de recuperar das mãos dos muçulmanos os “lugares santos” da Palestina. Em novembro de 1095, o Papa Urbano II encorajou as massas a combaterem contra os turcos seljúcidas que invadiram o Império Bizantino e sujeitaram os católicos gregos, sírios e armênios. Ele também queria estender o seu poder político e religioso. Para encorajar os católicos a se envolverem em uma guerra sangrenta em “nome de Deus”, o papa ofereceu perdão de pecados, proteção para as terras pertencentes aos cruzados e a perspectiva de despojos (vede Hitchens e Roupp, 2001, p. 186).

Embora multidões de pessoas respondessem ao chamado para se unir às Cruzadas, elas falharam em cumprir o objetivo inicial de recuperar as Terras Santas. Após muitos anos de luta e perda de muitas vidas, as Terras Santas ainda estavam em mãos muçulmanas. Não obstante, os cruzados melhoraram o relacionamento entre as nações católicas e detiveram o avanço dos turcos na Europa.

Logo após as Cruzadas, novas ideologias, que o Catolicismo considerou heresias, ameaçaram a Igreja Católica. Multidões de pessoas, induzidas por incansáveis líderes religiosos, executaram os que eram considerados hereges sem nenhum processo judicial. A necessidade de uma regulamentação judicial concernente à heresia, a preocupação católica com o crescimento de novas idéias revolucionárias, e o desejo de aumentar o poder da Igreja Católica, deram origem a outra onda de derramamento de sangue paradoxalmente conhecida na história como a “Santa” Inquisição.

A Inquisição é descrita geralmente como a instituição judicial criada na Idade Média para lidar com os inimigos da religião do estado (i.e. o Catolicismo). Havia três tripos de inquisição.

1. A Inquisição Episcopal foi estabelecida pelo Papa Lúcio III em 1184. Era supervisionada e administrada pelos bispos locais. Uma vez que as doutrinas ortodoxas estavam estabelecidas, qualquer desvio delas era investigado e estudado pelo bispo da respectiva diocese. Se o “crime” fosse confirmado, era punido, primariamente por meio de penas canônicas (vede Chami, 1999a).

2. A Inquisição Pontifícia foi criada pelo Papa Gregório IX em 1231 (vede Schmandt, 1988, 10:277). Este tipo de inquisição foi confiada à ordem dominicana, a qual respondia apenas ao pontífice. Foi introduzida na França em 1233, em Aragão em 1238 e na Itália em 1254 (Mattox, 1961, pp. 214-215). Os inquisidores iam ao lugar da suposta heresia, e com a ajuda das autoridades pediam que os hereges se apresentassem voluntariamente diante do tribunal. O público também era encorajado a delatar hereges; qualquer um poderia acusar algum outro de heresia. O acusado era forçado a confessar sua “heresia” sem oportunidade de confrontar seus acusadores ou de se defender. Um longo aprisionamento aguardava o “herege” que negasse as acusações. Seu aprisionamento era interrompido por inúmeras seções de tortura até que ele confessasse sua “heresia”. Se continuasse a se recusar a confessar, era entregue às autoridades civis, as quais administravam a pena de morte ao “herege obstinado”.

3. A Inquisição Espanhola é considerada a mais terrível de todas. Começou em 1478 com a aprovação do Papa Sixto IV, e durou até 1834 (vede “Inquisition”, 1997, 6:328). Este tribunal era diferente da Inquisição Pontifícia porque o inquisidor era designado pelo rei ao invés do papa, de modo que o inquisidor tornou-se um servo do estado ao invés da igreja (vede Chami, 1999b). Alguns dos principais motivos para esta inquisição foram:

a) a “ameaça” judaica – nos séculos 14 e 15, a Europa era assolada por graves crises economicas. Muitas pragas e epidemias contribuíram para esta situação. Devido a suas rigorosas práticas higiênicas, os judeus da Europa sobreviviam a estas epidemias e pragas. Enquanto os europeus caíam em desespero e pobreza, a maioria dos judeus retinha o seu status econômico. Esta situação produziu muitos protestos contra os judeus e aumentou a avareza religiosa e política pela confiscação da riqueza judaica. Forçados a abandonar suas atividades econômicas, e sendo pressionados por padres fanáticos, muitos judeus se converteram à religião católica no princípio do século 15. Muitos católicos tornaram-se ciosos do contínuo progresso financeiro e da posição social destes judeus e acusaram-nos de conversão artificial e insincera (vede Domínquez, n.d.).

b) A necessidade de unidade no reino – a Espanha fora unida politicamente sob os “Reis Católicos” Fernando de Aragão e Isabel de Castela, mas ainda havia ideologias religiosas diferentes no país. Esperando unir religiosamente o seu país, os reis pediram ao papa permissão para “purificar” seu reino das ideologias não-católicas por meio da Inquisição (vede Chami, 1999b).

Estes foram os motivos para a cruel Inquisição Espanhola. Em tempo, este tribunal bárbaro dedicou-se à perseguição de muçulmanos, supostas bruxas, e partidários do Protestantismo.

Embora as inquisições anteriores fossem cruéis, a Inquisição Espanhola foi projetada para aterrorizar até o mais vil criminoso. Seus instrumentos de tortura eram ainda mais inovadores e desumanos do que os de tempos passados. Os tratamentos com tortura incluíam, mas não estavam limitados a: (1) deslocamento das juntas do corpo; (2) mutilação das cavidades vaginal, anal e oral; (3) remoção de línguas, mamilos, orelhas, narizes, genitálias e intestinos; (4) Fraturamento de pernas, braços, dedos das mãos e dos pés; (5) esmagamento das articulações, das unhas e cabeças; (6) serramento do corpo ao meio; (7) perfuração da pele e dos ossos; (8) esfolamento da pele do rosto, abdômen, costas, extremidades e seios; e (9) estiramento das extremidades do corpo (vede Rodriguez, 2007).

Ainda que o Catolicismo queira negar o seu passado, a história fala em alta voz a respeito das atrocidades cometidas em nome da fé católica. O Catolicismo pode tentar esconder-se por detrás das injustiças cometidas por outros grupos religiosos para encobrir a sua própria desgraça, mas a verdade é que a metodologia católica foi a inspiração para as telas sanguinárias de outros “artistas” religiosos. Não há dúvida de que as Cruzadas e a Inquisição representaram um papel importante no desenvolvimento e no crescimento da Igreja Católica em um mundo que não queria se conformar a este tipo de religião.

CATOLICISMO EM TEMPOS RECENTES

No passado, a Igreja Católica usou métodos violentos para destruir a oposição aos seus ensinos e práticas. Hoje, sem a tortura, os tribunais e a matança, o Catolicismo parece passivo em relação ao crescimento de outras religiões.

O princípio do século 16 adicionou mais combustível ao fogo da Inquisição. Noventa e cinco razões para isto foram pregadas na porta do edifício da Igreja Católica em Wittenberg, Alemanha. Quem foi o responsável? Um homem: Martinho Lutero. Embora alguns antes dele já tivessem tentado acender o fogo da reforma (p.e. John Wycliffe, John Huss e outros), o movimento da Reforma fora ineficaz antes de Lutero.

Martinho Lutero nascera em Eisleben, Saxônia, Alemanha, em 1483. Ele era filho de um mineiro pobre e pagou seus estudos na Universidade de Erfurt com esmolas que recebia. Em 1505, tornou-se mais interessado na salvação de sua alma e na busca pela paz espiritual do que no estudo da lei. Entrou para o monastério agostiniano de Erfurt, onde tornou-se um monge devoto, mas espiritualmente inquieto. Por volta de 1508, Lutero havia chegado à conclusão de que alguns ensinos e a organização da Igreja Católica eram completamente diferentes dos do Novo Testamento. A imoralidade do clero de Roma, a irreverência para com os sacramentos pelos seus próprios defensores, e a avareza daqueles que coletavam indulgências e outras penas colocaram Martinho Lutero em um curso de colisão com a Igreja Católica. Em 1517, suas 95 teses incomodaram o mundo católico a ponto de, cerca de 1520, o papa redigir uma bula convocando Lutero a se retratar dos seus ensinos ou ser excomungado. Porém, ele não cedeu a esta ameaça, e continou a difundir os seus ensinos (vede Mattox, 196, pp. 243-261; Pelikan, 1988, 12:531-533). Outros, como Huldreich Zwingli (1484-1531), na Suíça, e João Calvino (1509-1564), na França e em Genebra, Suíça, também contribuíram grandemente para a Reforma e o desenvolvimento das religiões protestantes.

Diversas condições ajudaram o progresso da Reforma no século 16: (1) A Renassença – este movimento cultural estimulou a liberdade intelectual e despertou entusiástico estudo das Escrituras na Europa. Muitas pessoas começaram a perceber a diferença entre o Catolicismo e o Cristianismo do Novo Testamento. (2) A corrupção da hierarquia da Igreja Católica – o dinheiro trazia direitos e privilégios, e a imoralidade imperava na época, mesmo entre o clero católico. A inconsistência entre a fé e a prática tornaram-se notórias. (3) O apoio de governantes seculares à oposição à hierarquia católica – por este tempo, a Igreja Católica possuía um terço do território da Europa Ocidental. Reis e governantes estavam ávidos por possuir estas terras, bem como outras propriedades que a igreja havia tomado para si. (4) O advento da imprensa – Lutero e outros usaram a imprensa para difundir suas idéias e as Escrituras por toda a Alemanha e outros países (vede Mattox, 1961, pp. 239-246). Por volta de 1542, o Protestantismo estava se espalhando por muitos lugares e penetrando com as suas doutrinas até na Itália. Devido ao seu temor por esta nova rebelião ideológica, o Papa Paulo III incitou o público e os líderes eclesiásticos a voltarem para os níveis severos da Inquisição. Apesar disto, o Protestantismo prosperou.

A Igreja Católica havia encontrado um grande inimigo que aparentemente não tinha a menor intenção de se render. Porém, o “Santo Ofício” da Inquisição continuou a operar durante os séculos subsequentes e se espandiu até as colônicas da Espanha no Novo Mundo. O tribunal da Inquisição tinha jurisdição sobre outros tribunais organizados nas colônias da América Latina. Nestas colônias, a Inquisição não alcançou o mesmo nível vergonhoso que alcançou na Europa, visto que os nativos estavam apenas começando a aprender a religião católica e ainda não entendiam todo o dogma católico. Mas o pobre exemplo de “bondade” demonstrado nas nações conquistadas não podia apagar a crueldade inerente do “santo” tribunal.

Em 1808, José Bonaparte (irmão de Napoleão) assinou um decreto pondo um fim ao “Santo Ofício”, mas foi apenas em 1834 que o édito final de sua abolição foi publicado (vede O’Malley, 2001; “Inquisition”, 1997; 6:328). Tendo o seu braço político, militar e social quebrado, a única coisa que restava para a Igreja Católica era “seguir o rebanho” e aceitar o que parecia ser o fim da sua ditadura.

Em completo contraste com o seu passado, a Igreja Católica tornou-se progressivamente mais tolerante com outras religiões, apesar da sua oposição verbal e pública. Esta tolerância levou a uma mistura do Catolicismo com as religiões evangélicas, como o Luteranismo, o Pentecostalismo, etc., resultando em sérias repercussões para o mundo católico. Esta situação mostra claramente que este tipo de religião não está baseado na Bíblia, mas em preferências religiosas. Ninguém pode dizer com certeza o que a Igreja Católica se tornará ou aceitará no futuro, mas a história ilustra claramente as suas crenças e práticas do passado.

Referências

Chami, Pablo A. (1999a), “Origin of the Inquisition” [“Origen de la Inquisición”], [On-line], URL: http://www.pachami.com/Inquisicion/Origen.html.
Chami, Pablo A. (1999b), “The Spanish Inquisition” [“La Inquisición en España”], [On-line], URL: http://pachami.com/Inquisicion/Espa.htm.
Domínguez, Antonio O. (no date), “The Jewish Problem” [“El Problema Judío”], [On-line], URL: http://www.vallenajerilla.com/berceo/florilegio/inquisicion/problema judio.htm.
Hitchens, Marilynn and Heidi Roupp (2001), How to Prepare for SAT: World History (Hauppauge, NY: Barron’s Educational Series).
“Inquisition” (1997), The New Encyclopædia Britannica (London: Encyclopædia Britannica).
Mattox, F.W. (1961), The Eternal Kingdom (Delight, AR: Gospel Light).
O’Malley, John W (2001), “Inquisition,” Encarta Encyclopedia 2002 (Redmond, WA: Microsoft Corporation).
Pelikan, Jaroslav (1988), “Luther, Martin,” The World Book Encyclopedia (Chicago, IL: World Book).
Rodriguez, Ana (2007), “Inquisition: Torture Instruments, ‘a Cultural Shock’ for the Audience” [“Inquisición: Instrumentos de Tortura, ‘Sacudida Cultural’ para el Espectador”], La Jornada, March 9, [On-line], URL: http://www.jornada.unam.mx/2007/01/09/index.php?section=cultura&;article=a04n1cul.
Schmandt, Raymond H. (1988), The World Book Encyclopedia (Chicago, IL: World Book).


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Fonte: Apologetics Press (http://www.apologeticspress.org)
Tradução: Rodrigo Reis de Faria

sábado, 17 de novembro de 2012

Origem e História do Catolicismo (Parte I)


Moisés Pinedo

Com frequência, os católicos fazem duas afirmações importantes: (1) a Igreja Católica é a igreja mais antiga (os católicos estão firmemente convictos de que a Igreja Católica é bem mais antiga que qualquer grupo protestante que existe hoje. Embora esta afirmativa esteja historicamente correta, será verdade que a Igreja Católica é a igreja mais antiga?) (2) a Igreja Católica é a igreja bíblica (os católicos alegam que sua igreja é aquela descrita na Bíblia e, portanto, a igreja que Deus aprova).

Estas duas reivindicações trazem algumas sérias implicações. Primeiro, se a Igreja Católica é a igreja mais antiga, então: (a) não poderia haver nenhuma igreja antes dela; (b) a primeira igreja, a qual Cristo prometeu estabelecer, deve ser a Igreja Católica; e (c) todo o registro histórico e/ou bíblico da primeira igreja deve apontar para o Catolicismo. Segundo, se a Igreja Católica é a igreja bíblica, então: (a) a Bíblia deve ter um registro desta igreja; e (b) seus ensinos e práticas devem ser aprovados pela Bíblia.

ORIGENS DO CRISTIANISMO

Para determinar se a Igreja Católica é a igreja mais antiga, devemos ir à Bíblia para encontrar um registro acerca da primeira igreja. O profeta Daniel disse que

... o Deus do céu levantará um reino que nunca será destruído; e o reino não passará a outro povo; despedaçará e consumirá todos estes reinos, e permanecerá para sempre (2:44, ênfase acrescentada).

Deus tinha um plano para que os seguidores de Seu Filho fizessem parte de um reino diferente de qualquer outro, um reino espiritual que permaneceria para sempre: a igreja (cf. Colossenses 1:13). Mas quando começou esta instituição divina?

Mateus 16:18 registra a primeira vez em que o termo “igreja” é introduzido no Novo Testamento. Jesus disse: “E eu também te digo que tu és Pedro, e sobre esta rocha edificarei a minha igreja, e os portões do Hades não prevalecerão contra ela” (ênfase acrescentada). O termo “igreja”, do grego ekklesia, era geralmente usado pelos gregos para se referir a uma assembléia política (cf. Atos 19:41). Este termo é usado pela primeira vez para descrever os seguidores de Cristo em Mateus 16:18.

Quando Jesus falou a respeito da Sua igreja neste verso, Ele declarou três coisas muito importantes. Primeiro, Jesus disse: “Edificarei a minha igreja”. O tempo futuro do verbo indica que a igreja ainda não estava estabelecida. Ela não existia naquele tempo. Segundo, Jesus disse: “Eu edificarei”, indicando que o Próprio Cristo estabeleceria a igreja e seria o seu fundamento. Terceiro, Jesus disse: “a Minha igreja”, indicando que a Igreja pertenceria a Ele.
Note mais uma vez a declaração de Jesus a Pedro: “E eu também te digo que tu és Pedro, e sobre esta rocha edificarei a Minha igreja” (Mateus 16:18). Usando dois termos gregos – petros e petra – o Novo Testamento deixa claro que esta “rocha” (petra) seria o fundamento sobre o qual Jesus edificaria a Sua igreja. Mas ao que ou a quem esta “rocha” se refere? Mateus nos diz que Jesus havia perguntado aos Seus discípulos quem eles pensavam que Ele fosse: “Simão Pedro respondeu e disse: ‘Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo’” (Mateus 16:16). Por causa desta declaração, Jesus fez a afirmação mencionada acima (Mateus 16:18). Portanto, isto só pode significar uma coisa: Jesus iria edificar a Sua igreja sobre a confissão que Pedro havia feito a respeito dEle. Em outras palavras: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo” seria o fundamento sobre o qual a igreja seria edificada. Jesus prometeu a Pedro que ele seria a pessoa bem-aventurada a abrir as portas do Cristianismo (ou da igreja), mas Pedro (petros) não seria a rocha (petra) da igreja.

Embora estes versos em Mateus 16 não nos dêem o começo da primeira igreja, eles nos dão uma predição exata da sua origem, incluindo o seguinte:

  1. Esta igreja ainda não estava edificada no tempo em que Jesus estava falando (v. 18).
  2. Esta igreja seria edificada por Cristo, o Qual também seria o seu fundamento (v. 18).
  3. Esta igreja pertenceria a Cristo (v. 18).
  4. Esta igreja seria edificada sobre a confissão de que Jesus é o Cristo (vv. 16, 18).
  5. Pedro abriria (simbolicamente) as portas desta igreja (v. 19).
Nesse caso, então, quando estas coisas aconteceram, e quando a primeira igreja veio à existência?

Então aqueles que receberam alegremente a sua palavra foram batizados; e naquele dia cerca de três mil almas foram acrescentadas a eles (Atos 2:41).

Este verso, registrado por Lucas, nos conta o resultado do sermão de Pedro e dos outros apóstolos pregado em Pentecostes. A Bíblia nota que os apóstolos haviam permanecido em Jerusalém após a ascensão de Jesus, aguardando a promessa do Pai (ou seja, a chegada do Espírito Santo; cf. Atos 1:4, 12; 2:1). Quando o Espírito Santo foi enviado, os apóstolos começaram a falar em diferentes línguas (Atos 2:4-11). Muitas pessoas creram, mas houve também alguns que zombaram (Atos 2:13). Então, Pedro, pondo-se de pé com os onze, levantou a sua voz e pregou àqueles que o escutavam (Atos 2:14). Após mostrar evidência convincente acerca da veracidade messiânica de Jesus, Pedro declarou: “Portanto, saiba com certeza toda a casa de Israel que Deus fez a este Jesus, a quem vós crucificastes, Senhor e Cristo” (Atos 2:36; ênfase acrescentada).

O relato de Lucas leva nossas mentes de volta às palavras de Jesus. Jesus havia predito que Pedro abriria as portas da igreja, e que a igreja seria edificada sobre a sua confissão (Mateus 16:16-18). Em Atos 2:36, Pedro não apenas abriu as portas do Cristianismo, mas também confessou uma vez mais que Jesus era o Senhor e o Cristo (ou seja, a rocha sobre a qual a igreja seria edificada). Portanto, foi neste exato dia que as palavras de Jesus foram cumpridas. Atos 2:41 indica que aqueles que creram “foram batizados; e naquele dia cerca de três mil almas foram acrescentadas a eles”. A questão então se torna: “Ao que as pessoas que criam e eram batizadas foram acrescentadas?” O verso 47 nos dá a resposta: “o Senhor acrescentava todos os dias à igreja aqueles que estavam sendo salvos” (nota: A ASV omite a palavra “igreja” e anota “eles”, mas a idéia é a mesma. A respeito desta tradução, Boles disse que o sentido é de que aqueles que eram batizados “por meio deste processo eram reunidos, e assim formavam a igreja” [1941, p. 52]). Este é o primeiro texto bíblico que fala da igreja como estando em existência; é neste exato momento na Escritura que a presença da primeira igreja é notada. Pedro havia aberto as portas da igreja através da pregação da Palavra. Ele havia confessado uma vez mais a divindade de Jesus. E o Senhor havia acrescentado à Sua igreja as pessoas que obedeceram.

Que igreja, então, é a igreja mais antiga? A resposta é, naturalmente, a igreja que Cristo edificou em Atos 2. Mas que igreja era esta? Seria este o começo da Igreja Católica (como o Catolicismo ensina)? Note que Cristo disse que Ele edificaria a Sua igreja (Mateus 16:18), não a Igreja Católica.

Saudai-vos uns aos outros com ósculo santo. As igrejas de Cristo vos saúdam (Romanos 16:16, ênfase acrescentada).

Embora houvesse várias congregações que louvavam a Deus em muitas partes do mundo quando o apóstolo Paulo escreveu esta carta aos romanos, ainda havia uma característica única sobre elas: todas elas pertenciam a Cristo (isto é, elas eram igrejas de Cristo), pois Cristo dissera que edificaria a Sua igreja. Portanto, todas elas honrosamente traziam o nome do seu Fundador – Cristo.

Atos 2 informa-nos que a igreja de Cristo foi estabelecida em Jerusalém no Dia de Pentecostes (c. 30 a.D.). Ela teve um único fundamento, Jesus Cristo (1 Coríntios 3:11). Cristo, não Pedro, era a pedra de esquina da igreja (cf. 1 Pedro 2:4-8). A igreja compreendia um grupo de crentes que adotaram o título de “cristãos” (não “católicos”) por autoridade divina (Atos 11:26; cf. Isaías 62:2). Eles compunham o único corpo de Cristo (Efésios 1:22-23; 4:4). A igreja também era considerada a esposa de Cristo (2 Coríntios 11:2; Efésios 5:24; Apocalipse 19:7). Cristo era a sua autoridade e a sua Cabeça (Colossenses 1:18); ela não tinha nenhuma cabeça terrena. Em sua organização, nomes e divisões humanas eram condenadas (1 Coríntios 1:10-13). Esta era a instituição divina e maravilhosa que Deus estabeleceu sobre a Terra – a igreja de Seu Filho, a igreja de Cristo (vede Miller, 2007).

ORIGEM DO CATOLICISMO

Se a Igreja Católica não é a igreja mais antiga, como e quando ela se tornou uma entidade histórica? Quando a igreja do Senhor começou em Atos 2, ela cresceu rapidamente. De acordo com Atos 2:41, cerca de 3.000 pessoas creram na pregação de Pedro e dos demais apóstolos, e foram batizadas. Atos 4:4 nos conta que, pouco depois, o número dos fiéis era de pelo menos 5.000, e Atos 6:7 informa-nos que “o número dos discípulos continuava a crescer grandemente em Jerusalém”.

No começo, o governo romano considerava os cristãos como sendo uma das várias e insignificantes seitas judaicas. O livro de Atos conclui notando que, mesmo sob custódia romana, Paulo continuava a pregar e ensinar “com toda a confiança, ninguém o impedindo” (Atos 28:31). Os romanos subestimavam o poder e influência do Cristianismo, concedendo à igreja tempo e oportunidades para crescer em seus primeiros anos (Atos 18:12-16; 23:23-29). Contudo, sempre houve grande oposição da parte dos líderes judeus ortodoxos daquele tempo, os quais intelectual, psicológica e fisicamente perseguiam os apóstolos e outros cristãos (p.e., Atos 4:1-3, 18; 5:17-18; 9:1-2, 22-24; 13:45, 50; 17:4-5, 13; 21:27-31; 23:12-22).

Embora a perseguição fosse um flagelo terrível para os cristãos, eles haviam sido advertido contra isto e sabiam como deviam reagir. Jesus havia alertado Seus discípulos em diferentes ocasiões a respeito das perseguições futuras por causa do Seu nome (Mateus 10:22). Ele lhes dissera que seriam perseguidos dos mesmos modos que Ele fora perseguido (João 15:19-20). Na verdade, a perseguição da parte dos judeus tornou-se uma realidade logo depois que a igreja começou (Atos 8:1). Por causa da sua hipocrisia e ignorância das Escrituras, os judeus endurecidos detestavam a mensagem do Evangelho.

Jesus também havia advertido Seus discípulos para que escapassem para outras cidades quando fossem perseguidos (Mateus 10:23). Ele não apenas queria que buscassem segurança, mas também pregassem o Evangelho em outros lugares. A princípio, os cristãos não queriam deixar a segurança e proteção de sua pátria, mas a perseguição forçou a sua partida (Atos 8:1; 11:19; etc.). Na medida em que se espalhavam, os cristãos começaram a obedecer à Grande Comissão dada pelo Senhor de “ir por todo o mundo e pregar o evangelho”, anunciando a chegada do reino do céu (Marcos 16:15; Mateus 28:19; cf. Atos 8:4; 14:4-7; et al.).

Em consequência dos seus esforços globais para ensinar e do zelo dos judeus em muitos dos lugares para onde os cristãos viajavam, o Cristianismo não apenas obteve interesse religioso, mas também atenção política. O governo romano começou a prestar mais atenção a esta “nova religião” que frequentemente era acusada de ser importuna e blasfêma em relação ao governo (cf. Atos 17:6-9; 19:23-27).

Suetônio, um historiador romano, parece confirmar este fato escrevendo o seguinte a respeito de Cláudio César: “Ele baniu de Roma todos os judeus, que estavam constantemente causando desordem por instigação de Cresto” (1890, p. 318). Claramente, pelo tempo do Imperador Cláudio (41 a 54 a.D.), esforços para intimidar e desacreditar os cristãos já eram um problema sério (cf. Atos 18:2). Quando Cláudio morreu, o infame Nero assumiu. Ele tinha grandes sonhos em construir uma Roma magnífica para satisfazer a seus próprios prazeres. Muitos historiadores acreditam que Nero foi responsável pelo grande incêndio que consumiu Roma em 64 a.D. e matou muitos dos seus habitantes (p.e., Suetônio, Dio Cássio, et al.; cf. Nelson, 1985, p. 450). Muitos dos seus contemporâneos também acreditavam que Nero fosse responsável. Para suprimir esses rumores, Nero acusou injustamente os cristãos do crime e castigou-os de formas inacreditavelmente terríveis. Suas ações encorajaram o ódio para com os cristãos (cf. Tácito, 1836, pp. 287-288). Os cristãos nunca haviam desfrutado da aprovação do Império Romano, mas Nero foi o primeiro imperador a instigar uma perseguição intensa contra eles. Perseguição intensa e excessiva continuou durante séculos. Como escreveu James Baird, “na realidade, o Cristianismo fora oposto mais vigorosamente do que qualquer outra religião na longa história de Roma” (1978, p. 29).

Mas, além dos infortúnios trazidos sobre o Cristianismo pelos oponentes da justiça divina, havia outro perigo no horizonte, um perigo ainda pior do que a própria perseguição: a apostasia predita. Em Seu ministério terreno, Jesus ensinou Seus discípulos a viver pela verdade, ensinar a verdade, e até morrer pela verdade. A verdade da Sua Palavra (João 17:17) era um tesouro inestimável. Jesus sabia que, após a Sua ascensão, a verdade seria desafiada, e muitos se afastariam dela. Em certa ocasião, Jesus advertiu Seus discípulos: “Acautelai-vos dos falsos profetas que vêm até vós vestidos como ovelhas, mas interiormente são lobos devoradores” (Mateus 7:15). Paulo confirmou o que Jesus disse quando escreveu: “Porque eu sei isto: que, depois da minha partida, entrarão no meio de vós lobos cruéis, que não perdoarão ao rebanho” (Atos 20:29). O apóstolo João escreveu sobre o cumprimento da profecia de Jesus como uma realidade presente (1 João 4:1). A apostasia que Jesus predisse existia então, e muitos já haviam abandonado a fé (cf. 2 Timóteo 4:10).

Contudo, a influência dos apóstolos ainda era forte e eles guardaram a pureza da verdade. Muitos dos escritos apostólicos preservados no Novo Testamento foram direcionados para corrigir falsos ensinamentos, defender a fé, e advertir novos cristãos acerca das doutrinas teológicas perigosas que surgiriam (cf. Gálatas 1:6-10; 1 Timóteo 4:1-3; 1 Pedro 3:15; 1 João). Para pôr em ordem algumas coisas que estavam faltando em algumas congregações e para defender “a fé que de uma vez por todas fora entregue aos santos” (Judas 3), Deus ordenou (através dos apóstolos) que uma pluralidade de anciãos (também chamados “bispos” ou “pastores” – Atos 20:17, 28; Tito 1:5, 7; 1 Pedro 5:1-4) fossem designados em cada congregação da igreja (Tito 1:5-9; cf. Filipenses 1:1; 1 Timóteo 3:1-7). Os anciãos estavam encarregados de orientar e alimentar o rebanho do Senhor (Atos 20:28). Era sua responsabilidade vigiar a igreja que Cristo comprara com o Seu próprio sangue (Efésios 5:25; Hebreus 7:26-27).

Com a morte dos apóstolos (que não deixaram sucessores apostólicos), os anciãos, juntamente com os diáconos, evangelistas e mestres, assumiram total responsabilidade de defender a fé. Muitos deles haviam sido instruídos diretamente pelos apóstolos, e assim foram parte fundamental do desenvolvimento espiritual da igreja (nota: Alguns destes homens às vezes são chamados de “pais da igreja” ou “pais apostólicos”). Em seu livro, The Eternal Kingdom, F. W. Mattox escreveu:

Durante os primeiros cinquenta anos após a morte do Apóstolo João, a igreja lutou para manter a pureza apostólica. A literatura deste período, escrita por homens que são comumente chamados de “Pais Apostólicos” e “Apologetas”, mostra claramente os esforços feitos para manter o padrão do Novo Testamento e as tendências que mais tarde levaram à apostasia (1961, p. 107).

Ainda que monumentais, muitos dos esforços destes apologetas antigos para unificar a igreja estavam erroneamente baseados em mera racionalidade humana. Pouco a pouco, novas idéias começaram a ser aceitas que instigaram mudanças na igreja. A primeira principal mudança tinha que ver com a organização da igreja, especificamente com a autoridade dos anciãos. Conforme temos notado, nos primeiros dias da igreja, cada congregação possuía uma pluralidade de anciãos que simultaneamente a vigiavam. Não obstante, muitos começaram a considerar um ancião como maior do que os outros, e eventualmente somente este recebia o título de “bispo”. Disputas e contendas pelo poder começaram. Mais tarde, “bispos” começaram a presidir individualmente sobre várias congregações em uma cidade, as quais chamavam de “diocese” (Latourette, 1965, p. 67).

Uma das pessoas que se esforçaram para unificar a igreja sob um único homem (ou seja, “o bispo”) foi Inácio de Antioquia. Em sua carta aos efésios, ele escreveu:

Pois, se neste breve espaço de tempo, tenho desfrutado de tamanha comunhão com o vosso bispo – não quero dizer de uma mera natureza humana, mas espiritual – quanto mais vos considero felizes por estardes tão unidos a ele como a Igreja está a Jesus Cristo, e como Jesus Cristo está ao Pai, para que todas as coisas possam concordam em unidade! ... Sejamos cuidadosos, então, para não nos colocarmos em oposição ao bispo, a fim de que possamos nos sujeitar a Deus (Roberts and Donaldson, 1973, 1:51).

Esta nova estrutura (ou seja, um bispo tendo autoridade sobre outros) começou como um chamado para defender a verdade, mas levou a tal afastamento do padrão divino que, por volta de 150 a.D., o governo de muitas congregações locais diferia completamente da organização simples esboçada no Novo Testamento. Esta mudança “inocente” na organização da igreja foi a semente que precedeu à germinação do movimento católico muitos anos mais tarde.

Em tempo, os bispos que exerciam autoridade em certas regiões começaram a se encontrar para discutir questões que interessavam a todos eles. Eventualmente, esses encontros tornaram-se concílios onde credos e novas idéias eram declaradas formalmente obrigatórias a todos os cristãos, e supostos hereges eram condenados.

Constantino, imperador de Roma, reuniu o primeiro desses concílios, o Concílio de Nicéia (325 a.D.). Pelo tempo do seu reinado, a população cristã havia crescido tremendamente. A despeito da constante perseguição e da crescente apostasia, muitos cristãos haviam permanecido fiéis a Deus, e sua influência era crescente. A fé, influência e coragem destes cristãos (que levaram muitos a morrer por amor à verdade) eram óbvias para Constantino. O Cristianismo era considerado, em certos sentidos, uma ameaça potencial para o Império se continuasse a crescer. Portanto, havia apenas duas opções: (1) tentar erradicar o Cristianismo do Império aumentando a oposição a ele (uma tática que havia fracassado durante quase três séculos), ou (2) “seguir a correnteza” para que o Cristianismo ajudasse a unificar e fortalecer o Império. Constantino decidiu não apenas parar a perseguição contra o Cristianismo mas promovê-lo. Para ajudar a igreja, Constantino ordenou que 50 cópias manuscritas da Bíblia fossem produzidas, e colocou alguns cristãos em posições elevadas no seu governo (Miller and Stevens, 1969, 5:48, 51). Além disso, ele restaurou lugares de adoração para os cristãos sem exigir pagamento (vede “The Edict...”, n.d.).

Sob a direção de Constantino, mais mudanças foram realizadas – especialmente na organização da igreja. Como o fim da perseguição era algo que os cristãos consideravam impossível, e como o favoritismo do governo parecia ainda menos alcançável, muitos cristãos se deixaram influenciar pelo governo a ponto de se desviarem cada vez mais da verdade. Sob a influência de Constantino, uma nova organização eclesiástica começou a se desenvolver, moldada segundo a organização do governo romano. Embora o “Cristianismo” medrasse sob sua influência, é irônico que o próprio Constantino não fosse um cristão. Contudo, somente antes da sua morte – e seguramente com a esperança de que seus pecados seriam removidos – ele concordou em ser batizado pela causa cristã (vede Hutchinson and Garrison, 1959, p. 146).

Embora o Catolicismo não viesse realmente à existência durante o tempo de Constantino, certamente sua influência e seu legado foram pedras fundamentais sobre as quais o Catolicismo logo desenvolveu o seu poder. Na medida em que a igreja obtinha benefícios do governo, tornou-se cada vez mais semelhante ao governo e afastou-se mais do padrão divino. Por volta do século sétimo, muitos cristãos, aceitando o modelo do governo romano, instalaram um homem – o papa – em Roma para exercer poder eclesiástico universal. De acordo com o modelo dos conselheiros do imperador romano, um grupo de cardeais foi eleito para serem consultores do papa. De acordo com o modelo dos governadores romanos, bispos foram designados sobre dioceses. E, em harmonia com o modelo do Império Romano Universal (i.e., católico), uma nova igreja – a Igreja Católica Romana – foi estabelecida. Consequentemente, a Igreja Católica foi estabelecida no começo do século sétimo, sob a liderança do primeiro homem a ser chamado universalmente de “papa” – Bonifácio III.

Referências

Baird, James O. (1978), “The Trials and Tribulations of the Church from the Beginning,” The Future of the Church, ed. William Woodson (Henderson, TN: Freed-Hardeman College).
Boles, H. Leo (1941), A Commentary on Acts of the Apostles (Nashville, TN: Gospel Advocate).
“The Edict of Milan” (no date), [On-line], URL: http://home.inreach.com/bstanley/edict.htm.
Hutchinson, Paul and Winfred Garrison (1959), 20 Centuries of Christianity (New York: Harcourt, Brace and Co.).
Latourette, Kenneth S. (1965), Christianity through the Ages (New York: Harper & Row)
Mattox, F.W. (1961), The Eternal Kingdom (Delight, AR: Gospel Light).
Miller, Dave (2007), What the Bible Says about the Church of Christ (Montgomery, AL: Apologetics Press).
Miller, Jule and Texas Stevens (1969), Visualized Bible Study Series: History of the Lord’s Church(Houston, TX: Gospel Services).
Nelson, Wilton M., ed. (1985), Illustrated Dictionary of the Bible [Diccionario Ilustrado de la Biblia] (Miami, FL: Editorial Caribe), fourteenth edition.
Roberts, Alexander and James Donaldson, eds. (1973 reprint), Ante-Nicene Fathers: The Apostolic Fathers with Justin Martyr and Irenaeus (Grand Rapids, MI: Eerdmans).
Suetonius Tranquillus (1890), The Lives of the Twelve Cæsars, trans. Alexander Thomson (London: George Bell and Sons).
Tacitus, Cornelius (1836), The Works of Cornelius Tacitus (Philadelphia, PA: Thomas Wardle).


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Fonte: Apologetics Press (http://www.apologeticspress.org)
Tradução: Rodrigo Reis de Faria

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Uma Breve Visão sobre o Evangelho de Judas



Patrick Zukeran

As manchetes dos jornais em todo o mundo noticiaram que o Evangelho perdido de Judas foi descoberto e traduzido. Repórteres afirmam que este evangelho lança nova luz sobre a vida de Cristo e Sua relação com Judas, que pode não ser o traidor retratado nos Evangelhos do Novo Testamento. Na verdade, ele pode ser o herói! Ele é projetado como o mais antigo e confidente dos discípulos de Jesus que traiu Jesus a pedido do Senhor! Este evangelho declara ainda que Jesus revelou um conhecimento secreto a Judas, instruindo-o a denunciar Jesus às autoridades romanas. Assim, ao invés de agir por avareza ou influência satânica, Judas estava seguindo fielmente às ordens dadas por Cristo. Será que o Evangelho de Judas revela uma nova guinada na história da paixão de Cristo? Será que existem novas percepções históricas que deveriam fazer os cristãos se preocuparem?

O Evangelho de Judas foi descoberto em 1978 por um fazendeiro em uma caverna próxima a El Minya, no Egito central. Estudiosos datam este texto copta como tendo sido escrito entre 300 e 400 a.D.(1) A maioria dos estudiosos acredita que o texto original foi escrito em grego, e que o manuscrito original foi escrito na metade do segundo século.(2)

A autoria deste evangelho é desconhecida, mas é improvável que Judas ou um discípulo de Jesus o tenha escrito. Representa um pensamento gnóstico que começou a florescer por volta daquele tempo. A menção mais antiga ao mesmo é de Ireneu, escrevendo em 180 a.D., o qual condenou esta obra como herética.

O Evangelho de Judas é semelhante à literatura gnóstica encontrada em outras áreas ao longo do Nilo, incluindo a biblioteca de Nag Hammadi, que continha aproximadamente quarenta e cinco textos gnósticos, o Evangelho de Maria, o Evangelho de Pedro e outros textos.

O que é Gnosticismo?

O gnosticismo floresceu do segundo ao quarto século a.D. O que é gnosticismo? O gnosticismo deriva seu nome da palavra grega gnosis, que significa conhecimento e refere-se ao conhecimento místico ou secreto de Deus da unidade do eu com Deus. Eis aqui um sumário essencial da filosofia gnóstica.(3)

Primeiro, o gnosticismo ensinava o conhecimento secreto do dualismo, de que o mundo material era mau e o reino espiritual era puro. Segundo, Deus não é distinto do homem, mas a humanidade é, em essência, divina. Deus é o espírito e a luz no interior do indivíduo. Quando alguém entendesse a si mesmo, entenderia tudo. Terceiro, o problema fundamental no gnosticismo não era o pecado, mas a ignorância. O caminho para atingir a unidade com o divino era alcançando um conhecimento místico. Quarto, a salvação era alcançada obtendo-se um conhecimento secreto, ou gnosis, da natureza real do mundo e do eu. Quinto, o alvo no gnosticismo era a unidade com Deus. Isto ocorreria através do escape da prisão do corpo impuro, a fim de que a alma do indivíduo viajasse através do espaço, evitando demônios hostis, e unindo-se a Deus.

Em referência a Jesus, o gnosticismo ensinava que Jesus não era distinto dos Seus discípulos. Aqueles que atingiam a percepção gnóstica tornavam-se Cristo assim como Jesus. A professora de religião da Universidade de Princeton, Dr. Elaine Pagels, escreve: “Todo aquele que alcança a gnosis torna-se não mais um cristão, mas um Cristo”.(4) Assim, Jesus não foi o único Filho de Deus, e um salvador que morreria pelos pecados do mundo, mas um mestre que revelou um conhecimento secreto a seguidores dignos.

A filosofia gnóstica é contrária aos ensinos do Antigo e Novo Testamento. A Bíblia está em oposição ao ensino gnóstico em doutrinas fundamentais, como a natureza de Deus, Cristo, o mundo material, o pecado, a salvação e a eternidade. Judeus e cristãos rejeitaram o ensino gnóstico como herético, e os gnósticos rejeitaram o Cristianismo. A filosofia gnóstica é ensinada por todo o Evangelho de Judas. Assim como outra literatura gnóstica, há muito pouca similaridade entre o Evangelho de Judas e os escritos do Novo Testamento. Este evangelho contradiz o Novo Testamento em áreas essenciais.

Conteúdo do Evangelho de Judas

A filosofia gnóstica é contrária ao Cristianismo bíblico, e o Evangelho de Judas reflete mais o pensamento gnóstico do que teologia bíblica. Um exemplo de filosofia gnóstica é refletido na missão de Jesus conforme representada neste evangelho.

Dr. Marvin Meyer, professor de Bíblia no Chapman College, resume o objetivo da missão de Jesus segundo este evangelho.

“Para Jesus no Evangelho de Judas, a morte não é uma tragédia, nem é um mal necessário para conseguir o perdão dos pecados ... A morte, como saída desta existência física absurda, não deve ser temida nem receada. Longe de ser uma ocasião de tristeza, a morte é o meio pelo qual Jesus é liberado da carne a fim de pudesse voltar para o seu lar celestial, e, traindo Jesus, Judas ajuda seu amigo a descartar seu corpo e libertar seu eu interior, o eu divino”.(5)

No Novo Testamento, a missão de Jesus é claramente determinada. Ele veio para morrer uma morte expiadora pelos pecados do mundo e vencer a sepultura com a Sua ressurreição corporal. Isto contradiz o Evangelho de Judas, que ensina que Cristo buscou a morte para libertar-se do aprisionamento de seu corpo.

Outro ensino gnóstico fundamental é que o problema do homem não é o pecado, mas a ignorância. Jesus não é um salvador, mas um mestre que revela este conhecimento secreto apenas àqueles que são dignos desta compreensão. Judas é considerado digno deste conhecimento. Dr. Meyer escreve:

“Para os gnósticos, o problema fundamental da vida humana não é o pecado, mas a ignorância, e o melhor meio de tratar deste problema não é através da fé, mas através do conhecimento. No Evangelho de Judas, Jesus comunica a Judas – e aos leitores do evangelho – o conhecimento que pode erradicar a ignorância e levar a uma consciência de si mesmo e de Deus”.(6)

Outro ensino gnóstico é de que, visto como o mundo físico é mau, Deus não criou o mundo físico. Ao invés disso, Ele cria éons e anjos que, por sua vez, criam, trazem ordem e governam sobre o mundo físico. Visto que a matéria é impura, Deus não entra diretamente na criação física. No Evangelho de Judas, Jesus pergunta aos Seus discípulos: “Como me conheceis?” Eles são incapazes de responder corretamente. Contudo, Judas responde dizendo: “Conheço quem tu és e de onde vieste. Tu és do reino imortal de Barbelo”.

Barbelo no gnosticismo é a primeira emanação de Deus, geralmente descrito como uma figura materno-paternal. Visto que Deus não entra no mundo material porque este é impuro, Barbelo é um reino intermediário do qual o mundo material pode ser criado sem contaminar Deus.(7)

Barbelo é claramente um termo gnóstico e estranho ao Cristianismo. Jesus disse em João 3:13 que Ele é do céu. A palavra grega é ouranos. Outras vezes, os escritores do Novo Testamento vêem Jesus como estando assentado à destra do Pai. Jesus está no céu com o Seu Pai, com quem Ele habita eternamente.

Razões pelas quais o Evangelho de Judas não faz parte do Novo Testamento

Existem diversas razões pelas quais não deveríamos considerar o Evangelho de Judas como escritura inspirada. Primeiro, foi escrito muito tarde para ter alguma conexão apostólica. Os Apóstolos de Cristo receberam a autoridade de escrever escritura inspirada. Uma das exigências para inclusão no cânon do Novo Testamento era que o livro tinha de ser escrito por um apóstolo ou companheiro imediato. Visto que era necessária uma conexão apostólica, o mesmo teria de ter sido escrito dentro do primeiro século. Há evidência convincente de que os quatro Evangelhos do Novo Testamento foram escritos no primeiro século a.D. (vede meu artigo Historical Reliability of the Gospels). O Evangelho de Judas foi escrito na metade do segundo século a.D., portanto é muito tardio para ser apostólico.

Segundo, a literatura inspirada deve ser consistente com a revelação anterior. Deus não é Deus de erro, mas de verdade, e Sua palavra não apresentaria reivindicações de verdade contraditórias. A filosofia gnóstica em Judas é inconsistente com os ensinos do Antigo e Novo Testamentos.

O Antigo Testamento ensina que Deus criou o universo físico, e Adão e Eva (Gênesis 1-3). No relato da criação em Gênesis, Deus criou todas as coisas boas. Assim, ao contrário do gnosticismo, Deus criou o mundo físico e Ele o declarou bom.

O gnosticismo ensina que Deus não criaria um universo físico porque o mundo material é impuro, por isso Deus cria éons e anjos. Estes seres, por sua vez, criam o reino físico. No Evangelho de Judas, Jesus revela a Judas a criação do mundo, da humanidade, e de inúmeros éons e anjos. Os anjos trazem ordem ao caos. Um dos anjos, Saklas, moldou Adão e Eva. O Evangelho diz:

“Que doze anjos venham à existência para governar o caos e o [mundo inferior]. E eis que da nuvem apareceu um [anjo] cujo rosto reluzia com fogo e cuja aparência estava contaminada com sangue. Seu nome era Nebro, que significa rebelde; outros o chamam de Yaldabaoth. Outro anjo, Saklas, também saiu da nuvem. Assim, Nebro criou seis anjos – bem como Saklas – para serem assistentes, e estes produziram doze anjos nos céus, cada um recebendo uma porção nos céus”.

Também declara:

“Então Saklas disse aos seus anjos: ‘Criemos um ser humano segundo a semelhança e segundo a imagem. Eles moldaram Adão e sua esposa, Eva, que é chamada, na nuvem, de Zoe”.

Isto contradiz o ensino no Antigo Testamento de que o Próprio Deus criou o universo. Depois, Deus criou Adão a partir da terra, e sua esposa, Eva, a partir de Adão.

O Evangelho de Judas contradiz o ensino do Novo Testamento também. O Evangelho ensina que o corpo é mau e que Jesus queria escapar de Seu corpo físico. Jesus instrui Judas dizendo: “Mas tu (Judas) sobressairás a todos eles. Pois tu sacrificarás o homem que me veste”. A morte de Jesus através da assistência de Judas liberaria o Seu espírito para unir-se a Deus.(8)

Contudo, o Novo Testamento ensina que Jesus não queria escapar de Seu corpo. Na verdade, Jesus ensinou que Sua ressurreição seria uma ressurreição física (João 2:19-22). Em Lucas 24:39, Jesus deixa claro a Seus discípulos que Ele possui um corpo físico: “Vede as Minhas mãos e os Meus pés, que sou Eu mesmo; tocai-Me e vede, pois um espírito não tem carne e ossos, como vedes que Eu tenho”. Em João 20 e 21, Jesus revela que isto foi uma ressurreição física do corpo que estava na cruz. Ele convida Tomé, no capítulo 20, a tocar Suas cicatrizes. Se Jesus tivesse ressuscitado como um espírito, Ele seria culpado de enganar Seus discípulos.

Em 1 Coríntios 15, Paulo ensina uma ressurreição física. Ele explica que Cristo ressuscitou dentre os mortos e mais de quinhentas testemunhas atestaram o fato. Em seguida, ele explica que o corpo da ressurreição é um corpo físico, mas diferente dos nossos corpos terrenos. Na ressurreição, os cristãos terão corpos físicos glorificados, uma clara contradição com o gnosticismo, que procura escapar do corpo físico impuro. Paulo não ensinou os cristãos a escaparem do corpo, mas a aguardar a ressurreição do corpo (1 Tessalonicenses 4:13-18).

Conclusão

Apesar da propaganda espalhafatosa da mídia, o Evangelho de Judas não afeta a confiabilidade histórica dos Evangelhos, nem representa qualquer ameaça à divindade de Cristo. Este evangelho não pode ser considerado como escritura inspirada como os livros do Novo Testamento. Foi escrito no final do segundo século e, portanto, não foi escrito por um apóstolo de Cristo ou um companheiro imediato. Seus ensinos contradizem a revelação anterior do Antigo e do Novo Testamentos. Apresenta muito pouca informação para que pudesse ser considerado histórico. O Evangelho de Judas nos dá mais percepção sobre o gnosticismo primitivo, isso é tudo. Não apresenta nenhum fato histórico acerca de Jesus que afete o Novo Testamento em qualquer sentido.

Notas

1. Dan Vergano and Cathy Lynn Grossman, “Long-lost gospel of Judas casts ‘traitor’ in new light,” USA Today, 7 April 2006.
2. Rodolphe Kasser, Marvin Meyer and Gregor Wurst, The Gospel of Judas (Washington D.C.: National Geographic, 2006), 5.
3. Elaine Pagels, The Gnostic Gospels, (New York: Vintage Books, 1979), 119-141.
4. Pagels, 134.
5. Kasser, Meyer and Wurst, 4-5.
6. Ibid., 7.
7. en.wikipedia.org/wiki/Barbelo
8. Kasser, Meyer and Wurst, 43.


Fonte: Probe Ministries (http://www.probe.org)
Tradução: Rodrigo Reis de Faria